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segunda-feira, 18 de março de 2013

A mulher que declarou guerra ao HPV

Luísa Lina Villa foi a primeira a descobrir que o vírus é o causador da maioria dos cânceres de colo de útero
Fernanda Aranda, iG SP











Foto: DivulgaçãoLuisa Lina Villa declarou guerra ao HPV


Em tempos de Segunda Guerra Mundial, a matriarca dos Villa não conseguiu estudar. Com o marido e duas filhas no encalço, a mãe deixou a Itália e veio ao Brasil tentar uma nova vida. Após uma longa viagem de navio, olhou para a caçula Luisa Lina Villa e disparou a frase: “a educação será a sua missão”.
A menina obedeceu e fez dos livros e pesquisas seu objetivo de vida. E quando virou adulta utilizou todo o conhecimento adquirido nas escolas brasileiras para declarar uma nova guerra, desta vez pessoal.
O alvo escolhido pela italiana, naturalizada brasileira e bióloga pela USP foi o HPV. As pesquisas pioneiras de Luisa, iniciadas na década de 80, mudaram a forma da comunidade médica tratar as mulheres vítimas de câncer de colo de útero. Seus dias e noites analisando as moléculas cancerígenas no microscópio mostraram que o vírus, até então desconhecido, era o causador de uma das doenças que mais mata no País.

Guia de exames: saiba quais detectam o HPV

Só em 2012, o câncer de colo do útero deve fazer 30 mil novas vítimas (projeta o Instituto Nacional do Câncer). Descobrir que estes tumores tinham relação com o HPV, em mais de 40% dos casos, foi o primeiro passo para fazer do Papanicolaou um exame de rotina importante para resguardar a saúde da mulher. Os achados de Luisa também foram o embrião da vacina contra o HPV, hoje disponível na rede particular do País, mas que protege pacientes do mundo todo contra este tumor maligno.

Para travar esta batalha, Luísa conta que precisou ser movida a paixão. “Um amor incondicional à ciência”, define. Namoro antigo mesmo, que foi despertado aos 11 anos de idade, quando surpreendeu os pais ao fazer um pedido especial.
Sapos, apêndice e vestibular

Luisa estava sentada à mesa, esperando o jantar, quando o pai comunicou à família que precisaria fazer uma viagem aos Estados Unidos. Disse que ficaria alguns dias longe de São Paulo mas que poderia trazer dois presentes, um para a filha mais velha, amante de poesia, e outro para a mais nova, que era fissurada pela natureza.

“Minha irmã pediu goma de mascar, cadernos e bonecas, relíquias por aqui”, lembra. Já Luísa disparou: “ papai, quero um microscópio”.
“Desde muito pequena, eu tinha uma curiosidade latente em saber o que tinha dentro das coisas. Estava na primeira série do ensino fundamental e a professora havia ensinado o que era célula. Pirei com aquela informação”, conta.
“Imaginei que com um microscópio eu poderia saber como tudo funcionava. Quando meu pai trouxe o presente encomendado, comecei a minha investigação.”
A primeira coisa que Luisa observou foi uma gota d’água. Depois, um pouquinho do sangue tirado do indicador do pai. Em seguida, a casca da cebola, o tecido do vestido da mãe, os insetos. Os restos de comida, os sapos e muitas coisas passaram por aquela lente que aumenta (só) 5 vezes o tamanho das coisas. Os anos também passaram e a paixão pelos bichos, células e fibras aumentava.
Aos 14 anos, Luísa precisou tirar o apêndice e, em vão, a mãe tentou convencê-la a deixar o órgão no hospital. “Levei para casa. Guardei no formol. E vasculhava quase que diariamente aquelas fibras, aqueles tecidos, aquelas maravilhas”, diz, gargalhando, ao lembrar da insatisfação da família em ter de conviver com todos aqueles vidros espalhados pela casa. A irmã dizia que os vidros só continham "tranqueiras”, mas Luisa garantia que se tratavam de “micro-organismos importantíssimos para a vida”.
Fazendo jus ao pedido da mãe de ter a educação como tarefa, Luísa se preparava para escolher a carreira no vestibular. Biologia já era a alternativa certa, mas ficou ainda mais evidente em uma aula de ciências naturais.
“A professora explicou na aula sobre o DNA. Fiquei maravilhada e não queria fazer outra coisa na vida.”
Escolhas e propostas

Luísa Lina já estudava brincando – e não teve muita dificuldade para em 1969 entrar na USP. Naturalizou-se brasileira porque sonhava em dar aula em escola pública e este era uma condição do governo para contratar professores. De forma voluntária – e para ir se acostumando – dava aula de educação sexual para alunos do período noturno em um colégio do Estado.
Com apenas 17 anos, ela já percebia que os homens e mulheres, de qualquer idade, tinham uma dificuldade enorme em conhecer o próprio corpo, assimilar o autocuidado e a importância das relações sexuais seguras. Condutas essas que se mostrariam tão influentes, anos mais tarde, quando Luisa passou a pesquisar o HPV e constatou sua transmissão via sexo sem camisinha.
Nos corredores da USP, Luisa dividia essas experiências com a turma da Biologia, majoritariamente feminina. “Eram tantas mulheres que o pessoal da Física e da Medicina Veterinária (na época ainda com mais meninos do que meninas) só passava o intervalo com a gente”, diz. Entre um lanche e outro, ela começou um namoro com um dos futuros veterinários, relação que durou 13 anos e virou casamento.
“Meu grande parceiro, até hoje. Depois de casados, ficamos 6 anos juntos e acabamos nos separando. Com 35 de idade, quando as minhas amigas pensavam no segundo filho, eu estava me divorciando sem ter experimentado a maternidade.”
“É claro que eu sei o quanto a paixão pela ciência influenciou neste meu destino. Já confrontei várias vezes estes caminhos que trilhei, mas quando olho para trás, honestamente, não vejo como ter feito diferente”, diz com toda sinceridade Luísa Lina Villa.
Se do útero da pesquisadora não sairiam herdeiros, com o seu trabalho Luísa conseguiu deixar um importante legado. Suas pesquisas sobre microorganismo estavam a todo vapor, mas mudaram de foco quando ela recebeu um convite do Instituto Ludwig, uma das instituições internacionais mais importantes do mundo, para pesquisar “como era o câncer por dentro”.
“Eu nunca tinha parado para pensar nesta doença, mas a proposta me aguçou. Escolhi como foco o câncer de colo de útero e o de pênis e, desde então, estou debruçada neles”, pontua a pesquisadora
Dona Emozilia

O ano era 1982, as investigações começaram e no final daquela década a relação entre HPV, sigla misteriosa, e câncer de colo de útero e pênis já estava estabelecida, comprovada e publicada nas revistas médicas mais importantes. Luisa passou a ser convocada pela indústria farmacêutica para ajudar na busca por uma vacina preventiva. Na metade dos anos 90, as doses já estavam prontas e a bióloga cientista referenciada nos quatro quantos do mundo por ter conduzido a maior parte das pesquisas no Brasil.
Nos anos 2000, Luisa e sua equipe começaram a investigar a associação entre os tumores malignos na língua e pescoço e o mesmo vírus. Pela primeira vez, a relação entre sexo oral desprotegido e câncer na boca começou a ser divulgada.
A guerra contra o HPV, todos sabem, não foi vencida. Luísa ainda espera que a vacina chegue à rede pública brasileira, que as mulheres usem mais camisinha, que façam o Papanicolaou regularmente e que os homens não precisem ter o pênis amputado após um diagnóstico de câncer – quatro em dez causados pelo HPV – em estágio avançado. Mas ela sabe que a sua história é de sucesso e, a todo momento, diz que nenhuma história se faz sozinha.
Dedica as conquistas à mãe e sua frase “a educação é sua missão”, a todos os envolvidos nas pesquisas que ela já fez, aos concorrentes que trouxeram mais dados aos ensaios clínicos e ao professor da USP Ricardo Brentani (falecido em 2011 e um dos principais nomes da ciência internacional).
“Foi ele quem me soprou no ouvido, lá nos anos 1980, que a comunidade internacional estava de olho no HPV”, diz Luisa.
A pesquisadora elencou uma lista de nomes e, com entusiasmo, citou dona Emozilia, faxineira do Ludwig, com quem a bióloga testava os questionários sobre hábitos de vida antes de aplicá-los na população participante das pesquisas.
“Ela que me direcionava, dizia que as perguntas eram difíceis, fáceis, aplicáveis ou não.”
Luisa também coloca como peças fundamentais na história o pai e seu primeiro microscópio, que ainda está na sua penteadeira, com algumas partes faltando, mas com capacidade de mostrar como é importante conhecer as coisas por dentro.
Nova geração










Foto: Eduardo Cesar/FotoarenaMariana Diniz, 28 anos, pesquisa fórmulas contra o HPV desde os 20 de idade

quinta-feira, 14 de março de 2013

Livro ensina como largar a faculdade e aprender sozinho


Líder de movimento que questiona a validade do ensino superior nos Estados Unidos lança obra com dicas para jovens se desenvolverem fora das universidades

Tatiana Klix - iG SP 

Ir para a faculdade ainda é um plano quase unânime para jovens americanos, que se preocupam desde o início do ensino médio com suas notas – um dos critérios usados pelas instituições de ensino superior para selecionar estudantes – e em como vão pagar pelo curso mais tarde. Quase. Nos últimos anos, o aumento do desemprego e índices crescentes de graduados que passam dificuldades para honrar o crédito estudantil recebido antes da formatura fazem com que uma parcela deles questione a validade do curso superior. Para esses adolescentes, ou outros que ainda não pensaram nisso, um livro lançado este mês nos Estados Unidos – Hacking your Education (Hackear sua educação, em livre tradução) – incentiva a largar a faculdade e dá dicas de como aprender – e muito - fora das salas de aulas.



















Divulgação

Dale Stephen largou a faculdade e fundou um movimento pelo auto-aprendizado nos EUA

O autor da obra, Dale Stephen, de 21 anos, desistiu dos estudos formais quando estava no segundo semestre e recomenda a experiência. Ele é líder do movimento sem fins lucrativosUncollege (sem faculdade), cujo site foi lançado em 2011 para difundir a ideia de que é possível ter sucesso sem colocar os pés em uma universidade.

À época, descontente com o ambiente e o conhecimento que estava adquirindo no curso superior, decidiu que iria se desenvolver sozinho e transformar isso numa causa para revolucionar a educação. Para botar o projeto em prática, contou com a ajuda de US$ 100 mil (cerca de R$ 200 mil) do Thiel Fellowship , um programa que escolhe 20 jovens com menos de 20 anos por ano para abandonar a faculdade e se dedicar a algum projeto fora dela.

Dois anos depois, Stephen já concedeu inúmeras entrevistas, escreveu artigos, deu palestras, promoveu seminários e agora lançou seu livro pela editora Penguin. Em todos esses meios, o conceito essencial repetido por ele é o mesmo, de que o investimento realizado para cursar uma graduação nem sempre traz o melhor retorno e aprender sozinho fica cada vez mais fácil, através das informações disponíveis na internet.

“As pessoas aprendem de formas diferentes, em velocidade e tempo diferentes. E hackear a educação permite que você aprenda o que, quando, como e onde quiser”, explica Stephen em seu blog. Segundo ele, não é preciso ser um gênio para se sair bem fora da escola, mas ter criatividade e confiança.


 Divulgação
Livro ensina como a aprender sozinho

No site Uncollege há uma sessão com recursos de educação online, como o Coursera (de uma universidade tradicional) e outros independentes, como o creativeLIVE (de aulas ao vivo gratuitas com experts em vários temas), dicas de como planejar a educação informal, leituras sobre o tema e entrevistas com profissionais bem sucedidos que desistiram da faculdade. O livro apresenta o mesmo tipo de conteúdo, aprofunda as razões pelas quais Stephen acredita tanto no que chama de auto-aprendizagem e ensina como encontrar mentores, construir redes de contatos, onde achar conteúdos e como reuni-los de forma a desenvolver a própria educação. 

Curso

Além do livro, para quem quer seguir esse caminho, o defensor do ensino informal, também oferece um curso. O programa especial chamado Gap Year conduz 10 pessoas ao longo de um ano no processo de auto-aprendizado. No treinamento, os aprendizes recebem aulas para desenvolver um plano de aprendizado individual durante três meses em São Francisco, viajam para o exterior por mais três meses e entram em contato com pessoas e empresas inovadoras, desenvolvem um projeto pessoal nos três meses seguintes e terminam o programa trabalhando no que ele chama de "mundo real", durante mais três meses. Tudo isso, por US$ 12 mil (R$ 24 mil). Mas Stephen garante que dá para chegar ao mesmo objetivo por bem menos, apenas transformando a vida em educação e vice-versa.

Eles 'venderam' projeto social diferente para o ensino médio


Jovens arrecadam R$ 6 mil de apoiadores para dar aula de empreendedorismo e fazer adolescentes "sonharem mais alto"

Cinthia Rodrigues 
Em tempos de crise do ensino médio, um projeto de dois universitários com a ambiciosa meta de “fazer os alunos sonharem mais alto” foi – literalmente - comprado por pessoas dispostas a investir na ideia. Os jovens arrecadaram R$ 6 mil para cobrir os custos de um projeto piloto de aulas de empreendedorismo que eles mesmos ministrarão em escolas públicas do Paraná.

Fernando Granato, 24 anos, formado em engenharia elétrica e estudante de Administração, e Daniel Dipp, 23, no último ano de comunicação social dizem se basear na própria experiência. Os dois são bolsistas de diferentes programas de incentivo a iniciativas de jovens e acreditam que o currículo comum da escola não explora o potencial dos adolescentes.


Cartarse
Vídeo da Escola Quíron no Catarse para pedir colaborações em dinheiro

O projeto se chama Quíron, nome que na mitologia grega era dado a um centauro mentor de heróis. “Tem tudo a ver com nosso ideal. A maioria dos jovens sonha apenas em ter um trabalho remunerado e, mesmo assim, em funções bastante simples. A gente enxerga muito mais oportunidades”, diz Fernando. As aulas serão de empreendedorismo, inovação, auto-conhecimento e cidadania. A programação é dar, a partir de agosto, quatro horas de aulas, duas vezes por semana a 100 alunos de três escolas diferentes durante um semestre.

Tenho uma ideia. Você banca?

A ideia foi “vendida” no  site Catarse, espaço para financiamento coletivo. Funciona assim: o idealizador explica o que pretende fazer e de quanto dinheiro precisa. Internautas se inscrevem para doação e, se houver apoiadores suficientes para que todo o dinheiro seja reunido, as transações são efetivadas e o projeto vai adiante.

Em menos de dois meses 145 “apoiadores” doaram R$ 6.450 à  Escola Quíron. O dinheiro será usado apenas para compra de materiais como retroprojetor e impressão de apostilas. Os jovens trabalham no projeto em um escritório compartilhado a que têm direito como bolsistas do Hub Fellowship, outro programa de incentivo a jovens empreendedores no Paraná.
“Eu e o Daniel temos outras fontes de renda em trabalhos com horários flexíveis. Sempre nos organizamos para fazer algo social e acreditamos que a escola seja o melhor ponto de partida”, comenta Fernando. Para ele, a forma engessada das aulas é o maior problema do ensino médio – etapa da educação que amarga os piores índices da educação e não apresentam melhoras há 12 anos. “Estudos comprovam que você absorve muito mais de experiências do que do que lê e vê. Por isso a gente acha que a melhora passa por mais prática e envolvimento.”

terça-feira, 12 de março de 2013

Por uma pedagogia ambiental


por Marcus Eduardo de Oliveira*


Enquanto a aquisição de bens de consumo suntuosos continuar sendo toscamente confundida como símbolo de prosperidade, sucesso e possibilidade de ascensão social, determinando padrões distorcidos de conduta, certamente a humanidade retrocederá cada vez mais em termos de valores e princípios.

Se não bastasse essa distorção de valores que prioriza o “ter”, a sociedade de consumo deve sempre ser vista também como inimiga número um do meio ambiente. Se de fato desejamos habitar um mundo melhor, como é de senso comum, é de fundamental importância que todos desenvolvam visões diferenciadas sobre a natureza e o comportamento concernente à prática de consumo, não perdendo de vista que a poluição dos rios, do ar, o desgaste do solo, a perda de florestas e o desaparecimento de espécies animais e vegetais estão intimamente relacionados ao considerável aumento de energia, água e serviços ecossistêmicos usados largamente para manter elevadas taxas de produção atendendo assim essa sociedade de consumo.

Nossas relações sociais jamais podem se pautar e muito menos se fortalecer a partir das quantidades que consumimos; urge, definitivamente, romper-se com esses hábitos perdulários e consumistas. Qualidade de vida não pode estar associada à conquista material. Curvar-se a isso é restringir, pelas vias mais rasteiras possíveis, a própria vida a uma questão mercadológica.

Romper com essa ideia é imprescindível para a construção de um mundo ecologicamente mais equilibrado e saudável, respeitando a natureza e sabendo que mais produção é sinônimo de mais poluição, assim como menos consumo é sinônimo de mais vida.

Somente alcançaremos essa ruptura quando todos estiverem imbuídos de um mesmo ideal, criando consciência necessária para entender que o planeta não absorverá a parcela global da população mundial no ambiente de consumo em decorrência da finitude dos recursos naturais. Logo, não adianta incorporar o mercado de consumo; lá não há espaços para todos. Definitivamente, esse mercado precisa ser desinchado.

Para isso, um passo importante rumo a esse ambiente mais saudável é levar informações a todos e, principalmente, àqueles que serão encarregados de usufruírem o mundo num futuro próximo; ou seja, aqueles que literalmente “farão” esse mundo próximo. Nesse sentido, educar ambientalmente as crianças de hoje desde os anos iniciais de estudos é um bom caminho a ser percorrido. Nossos jovens alunos precisam aprender e praticar a pedagogia ambiental.

Essa pedagogia ambiental deve ser ensinada levando-se em conta que não é necessária maior produção para atender as reclamações vindas do mercado de consumo. O que já tem por aí em termos de mercadorias é suficiente para atender a todos. A necessidade se restringe em dirimir as desigualdades de consumo em que 20% da população que habita os países do hemisfério norte “engolem” 80% de tudo o que é produzido, gerando mais de 80% da poluição e degradação dos ecossistemas, ao passo que “sobra” apenas 20% da produção material para 80% da população dos países localizados no hemisfério sul.

Caberá a essa pedagogia ambiental, em forma de disciplina inserida na grade curricular, realçar o fato de que a excessiva exploração dos recursos naturais para “sustentar” a insustentável sociedade consumista é geradora mor de desigualdades e potencialmente criadora da insustentabilidade ambiental e social ora presenciada.

Essa pedagogia ambiental deve ser ensinada a partir do desenvolvimento de culturas próprias que sejam capazes de enaltecer o consumo verde, fazendo com que cada consumidor busque mercadorias que não agridam o meio ambiente, quer seja no ato da produção, durante a distribuição e, principalmente, após o uso, ao descartar-se um produto despejando-o no lixo, uma vez que é sabido que mais de 52% de nosso lixo não recebe tratamento adequado e, por isso, é altamente nocivo ao meio ambiente.

Essa pedagogia ambiental deve desenvolver canais que permitam maior politização do consumo, incluindo noções básicas e essenciais para evitar o desperdício de alimentos, água e energia elétrica bem como enfatizar práticas que favoreçam as técnicas e os processos de reciclagem. Carecemos muito desse tipo de cultura.

Essa pedagogia ambiental necessariamente deve servir para conscientizar nossos alunos sobre a importância em se preservar nossa rica biodiversidade uma vez que possuímos a maior extensão de floresta tropical do planeta (quase 65% do território), abrigando sete importantes biomas (Caatinga; Campos Sulinos, também conhecidos como “pampas”; Zona Costeira e Marinha; Amazônia brasileira, que contém cerca de 1/5 da água doce do planeta; Pantanal; Cerrado e Mata Atlântica) incorporando mais de 50 mil espécies de plantas (mais de 20% do total mundial), mais de 500 espécies de mamíferos, quase 1.700 aves e mais de 2.500 espécies de peixes.

Assim como uma andorinha só não faz verão, a conscientização coletiva, a partir dos ensinamentos emergidos da pedagogia ambiental poderá fazer toda a diferença num breve espaço de tempo. Assim esperamos!

* Marcus Eduardo de Oliveira é economista, professor e especialista em Política Internacional pela Universidad de La Habana – Cuba.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Educar para conviver

Tory Oliveira










Sem políticas de promoção da diversidade e combate ao preconceito contra homossexuais, a escola torna-se palco de intolerância e homofobia. Foto: Evaristo Sa/AFP

Convivência, respeito às diferenças e à diversidade são temas recorrentes nas aulas de Língua Portuguesa e Literatura dos alunos do 8º e 9º ano da Escola Esta­dual Frei José Maria Audrin. O professor Rubenilson Araújo, 37 anos, discute questões de gênero e diversidade sexual  com obras literárias, imagens e jornais. O objetivo é enfrentar a homofobia, o preconceito contra homossexuais. “Encontramos ainda muito preconceito. A escola está estagnada, não sabe lidar com os alunos homossexuais. Por conta do ambiente hostil, a maior parte deles acaba saindo”, critica o educador, que atua na rede pública de Porto Nacional, em Tocantins.

O educador fala por experiência própria. Homossexual, sofria com atitudes preconceituosas por parte dos colegas e dos professores em seu tempo de escola. “A minha vida foi marcada pela discriminação. Inúmeras vezes eu cheguei a fazer xixi na sala de aula porque os meninos me batiam se eu saísse da classe”, lembra. Dos professores, recebia indiferença ou simplesmente a ordem: “Seja homem!”

Histórias como as de Rubenilson ainda são realidade. Promovida pela Unesco em 2004 entre alunos brasileiros dos ensinos Fundamental e Médio, a pesquisa Juventude e ­Sexualidade revelou que um em cada quatro estudantes não gostaria de ter um colega de classe homossexual. Outra pesquisa realizada pelo órgão indica o preconceito também entre os educadores. De acordo com O Perfil dos Professores Brasileiros, 59,7% dos docentes acreditam ser “inadmissível” uma pessoa ter experiências homossexuais.

Publicada em 2009, a pesquisa Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil – Intolerância e Respeito às Diferenças Sexuais também examina a questão da discriminação em razão da orientação sexual. Um dado salta aos olhos: a escolaridade desponta como o fator mais determinante na diminuição da homofobia. Segundo a pesquisa, enquanto metade dos brasileiros que nunca frequentaram a escola (52%) apresenta comportamentos homofóbicos, apenas 10% daqueles com Ensino Superior manifestam o mesmo. Nenhuma das outras variáveis – como idade, renda ou religião – se mostrou um influenciador tão marcante.

Segundo o sociólogo e coordenador da pesquisa, Gustavo Venturi, várias hipóteses tentam explicar o porquê de a escola ser tão determinante para a diminuição do comportamento homofóbico. Desde os anos 1990, os parâmetros curriculares atuam como uma espécie de filtro sobre os conteúdos dos livros didáticos, que não podem apresentar expressões ou personagens racistas, homofóbicos ou misóginos (com conteúdo negativo ou de aversão às mulheres). Além disso, por ser um espaço de socialização mais amplo do que a família, a escola permite uma convivência maior com a diversidade. “Está demonstrado que a convivência com pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) provoca uma diminuição do preconceito. Ao conhecer de perto um gay, a pessoa acaba desmontando a imagem preconceituosa.”

“A escola é o espaço de formação de cidadania mais importante nas sociedades atuais”, afirma Marco Aurélio Máximo Prado, professor de psicologia da UFMG e pesquisador do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (NUH). Desde 2008, Prado é o coordenador-geral do Educação sem Homofobia, projeto de capacitação de professores sobre o tema que acontece em Minas ­Gerais.

Omissão

No entanto, o espaço de convívio também pode ser o de manifestação de preconceitos. Na ausência de políticas e propostas para lidar com esse tipo de conflito, o resultado é o efeito inverso, expresso nas piadas, no bullying e até na violência. No caso dos livros didáticos, ao mesmo tempo que não há conceitos discriminatórios expressos nas obras, também não há exemplos de diversidade sexual.

O ambiente escolar hostil para as populações LGBT foi captado pela pesquisa qualitativa realizada pela ONG Reprolatina em 2009. Uma investigação em 11 capitais brasileiras revelou que evasão escolar, tristeza, isolamento, depressão e até casos de suicídio são observados como consequência de uma escola homofóbica. Apesar de constatar a existência do preconceito, a pesquisa chegou à conclusão de que esses alunos são invisíveis para o resto da escola, o que acaba por determinar o tratamento dado à questão da homofobia. Em muitos casos, ela é minimizada ou naturalizada, geralmente expressa em brincadeiras ou piadas.  “Homofobia” apareceu como outro termo pouco familiar para os professores. A despeito das práticas de violência homofóbica relatadas na pesquisa em detalhes, muitos não conheciam o termo e nunca tinham pensado ou falado sobre o tema.
Fora dos muros da escola, a violência persiste. Levantamento realizado em 2012 com 1.217 homossexuais da capital paulista revelou que 70% já sofreram algum tipo de agressão. Segundo o estudo, feito pela Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, 62% dos entrevistados relataram agressões verbais, 15% agressões físicas e outros 6%, violência sexual. De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos, em 2011 foram registradas 1.259 denúncias de violência contra gays no Brasil. Nas contas do Grupo Gay da Bahia (GGB), pelo menos 266 homossexuais foram vítimas de homicídio no mesmo ano no País.

Para a educadora sexual e diretora do Instituto Kaplan, Maria Helena Vilela, a escola não está preparada e ainda sente dificuldade na hora de discutir o tema. “Ela se sente perdida, porque, na verdade, não aceita a homossexualidade como algo natural”, afirma. Outro problema é a confusão entre aceitação e apologia. Segundo a educadora sexual, muitos professores e escolas ainda acreditam que, ao aceitar a orientação sexual de um aluno, estariam incentivando seu comportamento.

Para Marco Prado, coordenador do projeto Educação sem Homofobia, não existe idade certa para começar a trabalhar diversidade e combate à homofobia em sala de aula. “Vai depender das demandas que o professor receber”, explica. “Criamos, por exemplo, um quebra-cabeça para crianças em que se colocam essas questões, de modo a construir uma roda de conversa”, exemplifica. Em outro projeto de intervenção elaborado durante o curso, batizado de Livro Fora do Armário, uma professora da Educação Infantil criou uma biblioteca específica sobre o tema da diversidade para as crianças.

Segundo Prado, a falta de informação geral sobre a sexualidade é o principal vilão no combate à homofobia e ao preconceito. Dentro do ambiente escolar, as aulas de educação sexual geralmente se voltam apenas para o aspecto biológico, com foco na prevenção de doenças e da gravidez.

O papel do professor

Além da desinformação, os professores também sentem muita insegurança na hora de agir. Como intervir, o que fazer e como negociar institucionalmente a exploração do tema são questionamentos levantados pelos educadores durante o curso de capacitação ministrado pela UFMG.

“A formação dos professores é precária do ponto de vista dessa discussão e as escolas geralmente têm pouco apoio das secretarias para criar um projeto mais direcionado. Além disso, muitas escolas públicas sofrem forte intervenção religiosa, o que acaba dificultando a exploração em profundidade desses temas. Todos os professores relataram questões ligadas à orientação sexual em sala de aula, como brincadeiras ou humilhações.” Na opinião de Prado, é preciso empoderar o professor para que ele possa pensar melhor em como agir diante desses casos. “Quando ele não faz nada, acaba sendo cúmplice.”

Para Maria Helena Vilela, do Instituto Kaplan, muitas vezes uma situação de homofobia pode ser o ponto de partida para o professor estender a discussão para o resto da turma. O primeiro ponto é o professor exigir respeito e também respeitar ele mesmo o aluno LGBT. “Perguntas como ‘por que você está brincando?’ e ‘o que existe nessa brincadeira?’ ajudam a desmontar o preconceito”, conta ela.

Além das discussões, jogos, brincadeiras e dinâmicas de grupos podem ajudar a trazer à tona o debate a respeito da diversidade sexual. “De forma geral, minha sugestão é que a escola abra essa temática, discuta com os alunos e ensine sobre a construção da sexua­lidade. Só entendendo como as pessoas se constroem sexualmente é possível aceitar o outro”, defende Maria Helena.

Discriminalização naturalizada

Realizada em 2009 pela Fundação Perseu Abramo em parceria com a alemã Rosa Luxemburg Stiftung, a pesquisa Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil  revela que 26% dos entrevistados admitiram nutrir preconceito contra gays, 27% contra lésbicas e bissexuais e 28% contra transexuais.

Surpreende, na visão do coordenador do estudo, Gustavo Venturi, a naturalização do preconceito. Ele cita uma pesquisa feita sobre discriminação racial em que apenas 4% admitiram preconceito contra negros. “O fato de que cerca de um quarto a um terço da população brasileira diga com naturalidade que tem preconceito contra os LGBT mostra a não aceitação em nossa sociedade”, analisa. A pesquisa também procurou investigar o preconceito velado: 54% dos entrevistados manifestaram preconceito classificado como leve.  Participaram do estudo 2.014 pessoas em 150 municípios de todo o Brasil.

domingo, 10 de março de 2013

O racismo não está nos olhos de quem vê


Blogueiro negro defende cotas raciais nas universidades até que todos deixem de tratar pretos como representantes de minoria

Mateus Prado  

Com a decisão da legalidade, pelo STF, das cotas raciais , as primeiras inscrições de alunos pela lei de cotas nas universidades públicas federais e a possibilidade real de cotas nas universidades públicas de São Paulo amplia-se o debate sobre questões de políticas afirmativas em relação à população afrodescendente. Boa parte deste debate tem sido feito de forma rasa e com boa dose de preconceito e/ou constrangimento em reconhecer as cotas como um direito que trata desiguais de forma desigual.

Convidei para participar dessa coluna através do texto abaixo, e assim colaborar no debate, o estudante André Rossi Pola Barbosa. André, blogueiro, é negro, filho de mãe solteira, militante do movimento negro e do movimento feminista. Já cursou farmácia em uma universidade particular e depois engenharia mecânica naval na Fundação Universidade do Rio Grande (FURG). Não era o caminho que queria, e hoje se dedica a estudar para conquistar uma vaga em medicina em uma universidade pública, se possível com a nota do Enem. André, por ter estudado o ensino médio em escola particular, não tem direito a concorrer pelas cotas da lei nacional.

Sobre igualdade, racismo e ações afirmativas - pois o racismo não está nos olhos de quem vê

Vivemos na era do politicamente correto. Isso é uma coisa boa, pois desse modo muitas pessoas percebem o quanto as expressões do dia-a-dia estão carregadas de preconceitos e menosprezo com as minorias. Assim, muitos indivíduos que se achavam deslocados do mundo repararam que não estão sozinhos e, disso, inúmeros movimentos se organizaram melhor (ou ganharam mais força) como o das feministas, o dos negros e o dos gays. A fim de melhorar e reivindicar certos direitos que, para eles, não eram garantidos ou não eram respeitados, esses grupos se organizaram e suas reivindicações encontraram grande resistência por parte de reacionários (pessoas que não aceitam mudanças na sociedade e preferem a ordem atual).

Uma dessas reivindicações foi a política de ações afirmativas, para que haja uma maior participação do negro na sociedade. Para isso, recentemente, o governo de São Paulo propôs às universidades estaduais que reservassem 50% das vagas para pretos (nomenclatura oficial para negros e pardos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE) e alunos de escola pública. Por isso, a classe média hoje vocifera palavras de igualdade, dizendo que as cotas vão apenas fomentar o racismo (que ela pensa não existir mais). No entanto, isso é uma falácia e tais ações se fazem necessárias para que justamente se diminua o racismo no Brasil.

A maioria das pessoas contrárias às cotas se indigna por elas tirarem a igualdade entre os cidadãos, porque todos são "iguais perante a lei". Todavia, não sabem da existência de dois tipos de igualdade: a formal e a material. O primeiro tipo de igualdade é a defendida pelos reacionários, de que todos são iguais, mas por meio desse tipo de igualdade os juristas verificaram que as diferenças sociais não deixavam de existir. Por causa disso, foi definida então a segunda igualdade, a material. Nesta, para tornar a sociedade mais igualitária, os mais desiguais serão tratados desigualmente ao pé de suas desigualdades - para que estes possam se tornar mais iguais ante os demais. Por isso foi importante a criminalização da homofobia, foi importante a instituição da lei "Maria da Penha" para combater a violência doméstica e assim também são importantes as cotas raciais e sociais nas universidades públicas.

A sociedade brasileira é a segunda maior sociedade de pretos do mundo, perdendo apenas para a Nigéria. Mas onde eles estão? Pois não constituem a maioria dos engenheiros, dos padres, dos médicos, dos professores, dos fisioterapeutas ou dos advogados. Porém, constituem a maioria em empregos como: auxiliares de obras, garçons, garis, carteiros, jardineiros, etc. Essas profissões não perdem a sua importância para a sociedade como aquelas outras, mas, não obstante, a possibilidade de ascensão social a partir delas é quase nula. O que explica o porquê de negros e pardos ficarem com essas profissões é a nossa história.

Quando se trata de escravidão, no imaginário das pessoas vem à tona a fazenda modelo de José de Alencar. Aquela fazenda cujo retrato ocorre nas novelas de época da Globo, onde o negro fica trabalhando normalmente sem reclamar e o branco vive o papel do protagonista. Contudo, a vida real dessas pessoas não foi assim. Além do trabalho árduo, o negro não passava de um objeto, não era considerado gente, nem portador de alma segundo a igreja na época. Sofria os mais variados tipos de castigos e de insultos, era considerado desleixado e vagabundo. Seu trabalho não era considerado de qualidade, daí vieram expressões como "serviço de preto" e "pretisse". Em 1888, em 13 de Maio, foi assinada a "Lei Áurea", que colocaria um fim à escravidão, com o crescimento da indústria no sudeste e o aparecimento do trabalho assalariado. A partir desses eventos, o negro passaria a ter um modo de vida, então, digno.

No entanto, isso não ocorreu. Por quê? Na época, havia inúmeras teorias racistas e a principal e mais arraigada na mentalidade da população era: negro é um estágio anterior dos brancos, tanto que havia "pesquisadores" empenhados em provar que o negro era menos evoluído. Ninguém conseguiu provar ou demonstrar tais teorias, porém elas contribuíram para o preconceito já existente. Em suma: negro não era gente. Além disso, a "Lei Áurea" apenas retirou o negro da condição de "objeto" e o pôs na sociedade totalmente "cru", sem estudo e nem preparo, portanto não havia condições de eles competirem com os imigrantes europeus e depois japoneses que desembarcavam aos milhares nos portos brasileiros. Os novos imigrantes eram atraídos pela possibilidade de emprego e de enriquecimento. Já para o governo da época, essa foi uma tentativa de "embranquecer" a população, pois uma das teorias então existentes era de que a miscigenação de "raças" (hoje temos clareza que não há outra raça além da humana) era prejudicial para um país e para os seres humanos. Assim o negro foi liberto, mas não garantiram meios para que ele pudesse sobreviver, e tudo isso ocorreu por causa da mentalidade até então existente.

O principal ainda era a ideia de que "preto é vagabundo", "preto não trabalha direito", "preto que não caga na entrada caga na saída" e outras inúmeras expressões e piadas que refletiam a mentalidade desse momento em que o negro entrava na sociedade. Por causa desse pensamento, sempre sobraram aos negros os piores serviços, pois o empregador não queria correr o risco de ter um funcionário "preguiçoso". Já o branco era muito mais trabalhador, tanto que, segundo o professor da Unesp, Dagoberto José Fonseca, surgiu a expressão "amanhã é dia de branco".

Largado às margens da sociedade, o ex-escravo e agora favelado fica a esmo nas grandes cidades, com dificuldade de encontrar emprego por não ter capacidade de competir com os imigrantes. Por estar desempregado e sempre criando o samba, dando risada, seu quadro foi agravado. Foram ratificados os estigmas de "vagabundo", "preguiçoso", "vadio" e, para piorar, eram alvos de piadas que mostravam a superioridade do branco, como: "Como preto sobe na vida? Quando explode o barraco" ou "Por que preto americano é melhor? Porque está nos Estados Unidos". Essas piadas foram transferidas atualmente para o pobre, para o gay. Por isso, atualmente, o politicamente correto se faz necessário para demonstrar que expressões tidas como "inofensivas" são racistas e pregam o preconceito devido a uma carga histórica já existente nelas. Portanto o preconceito, embora disfarçado, ainda persiste na sociedade brasileira por meio de ditados populares e não como dizem que ele está "nos olhos de quem vê", pois em cada expressão há uma origem de extrema discriminação. Atualmente isso ainda é propagado por meio de piadas, em especial.

O riso é, de certo modo, acusador das diferenças sociais. Há pessoas que dão risada das piadas anteriormente citadas, esse riso é o de quem concorda que essa é a atual situação do negro. O efeito humorístico nesse caso é criado pela hipérbole da situação deles nas cidades e, se essa situação não for mais evidente, não haverá mais o riso. Quando não houver mais humor, é porque a mensagem passada é um absurdo para a maioria da população e, então agora, o preto faz parte da maioria da sociedade. Isso evidencia como as cotas raciais são necessárias.

Mas e os brancos pobres? Embora a desigualdade social seja grande no País, o branco pobre tem maior facilidade em arrumar um emprego do que o preto pobre, por causa dos pensamentos anteriormente citados que dominam o subconsciente de pessoas ainda racistas. Tanto que, no início da década de 1990, era comum nos anúncios de emprego a exigência de "boa aparência". Por meio de uma investigação policial, verificou-se que a "boa aparência" era ser branco. Isso evidencia como o racismo ainda existe fortemente no Brasil. Quando houver mais negros e pardos ocupando cargos importantes, a ideia de que ele é "vagabundo", "preguiçoso" e "folgado" deixará de existir.

As cotas não constituem uma forma para acabar com a suposta "igualdade" existente, elas criarão possibilidades para que, no futuro, a sociedade seja mais igualitária. Ela o será quando o negro for colocado em maior evidência, quando for retirado dos empregos considerados menos importantes, quando for afastado dele o estigma de bandido e favelado, quando todos deixarem de rir de piadas racistas e outras insinuações que denigrem a sua imagem. Mas tudo isso leva tempo. Quanto tempo? O tempo até que todos deixarem de falar deles como minorias e passarmos a nos preocupar com a situação do ser humano e não mais da situação do negro.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Qualificação do professor é o que mais influencia bom desempenho de aluno


Estudo da UFMG e da Universidade de Stanford avaliou impacto dos docentes na qualidade educacional. Contratação por concurso público também alavanca ensino

Priscilla Borges - iG SP 

Para os pesquisadores, não há dúvidas de que o papel do professor é determinante para o bom desempenho escolar dos alunos. Embora outros fatores – como escolaridade dos pais; infraestrutura escolar; acesso a materiais didáticos – influenciem a aprendizagem, estudo mostra que a qualificação do professor e sua forma de contratação são os quesitos que mais impactam no sucesso de um aluno.

Os resultados identificados pela pesquisadora Raquel Rangel mostram que o País precisa investir muito em formação dos professores e na valorização da carreira. Raquel explica que considerou na pesquisa dados de provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de estudantes do 5º ao 9º ano do ensino fundamental da rede pública, aplicadas entre 1999 e 2003, e do questionário respondido por professores destes alunos.

Raquel criou uma escala, baseada na Teoria de Resposta ao Item , para comparar a evolução do desempenho dos alunos em cada série avaliada ao longo desse período. Em sua amostra, escolheu tratar dos dados apenas dos seis Estados com piores indicadores à época: Rondônia, Pará, Pernambuco, Sergipe, Mato Grosso do Sul e Goiás. Ao todo, os desempenhos de 1,2 mil alunos em português e matemática foram avaliados e as respostas de 581 docentes.

“Fomos muito rigorosos para medir esse impacto. Utilizamos um método estatístico que calculou o efeito médio de desempenho dos alunos a cada ‘dose de qualidade do professor’. Estatisticamente, o impacto da qualificação e da contratação por concurso público foi muito maior do que a experiência e o capital cultural do professor, a formação continuada, o uso de recursos pedagógicos, as estratégias de avaliação”, conta.

Raquel é estudante do doutorado em Demografia do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e realizou o estudo comomestrado na Universidade de Stanford , nos Estados Unidos. Orientada pelo professor Martin Carnoy, a pesquisadora comparou a situação brasileira à norte-americana e aponta que as realidades são muito distintas.

Segundo Raquel, nos Estados Unidos, como ter um diploma de ensino superior e de cursos de pós-graduação ou especialização é natural entre a maioria dos docentes, as discussões sobre “qualidade” do professor são bem diferentes. “Eles já avaliam o domínio da disciplina, o conhecimento didático, as técnicas pedagógicas, a motivação desse professor. O que queremos mostrar é que temos ainda problemas básicos para resolver. Como a formação”, diz.

Matemática X Português

O argumento de Raquel encontra força nos resultados de diferentes avaliações em larga escala feitas pelos estudantes brasileiros. Nesta quarta-feira, por exemplo, um levantamento realizado pela ONG Todos pela Educação mostrou que o desempenho dos alunos do ensino médio na Prova Brasil de 2011 piorou. Apenas 10% deles aprende o necessário em matemática e 29% em Língua Portuguesa.

“É importante ressaltar que avaliei o desempenho de seis Estados, que os dados não são recentes, mas os nossos problemas ainda são muitos e precários. Todos os indicadores de desempenho mostram que temos muito o que alcançar, especialmente nas escolas públicas”, pondera. Ela espera que os gestores se utilizem dessa constatação para investir na formação dos professores e na criação de atratividades para a carreira docente.
            

quinta-feira, 7 de março de 2013

Os filhos na creche e a pressa por melhora no ensino médio


Meus filhos acabaram de entrar na creche e minha maior preocupação em relação ao percurso escolar deles é o ensino médio. Faltam mais ou menos 14 anos para chegarem lá. Só isso. Já seria pouco tempo diante do bordão de especialistas da educação de que mudanças na área levam 30 anos, mas é um intervalo desesperadamente curto ao considerar quanto a etapa evoluiu nos últimos 12 anos: nada.

Como divulgado no dia 6 pelo movimento Todos pela Educação, de cada dez pessoas que se formaram no ensino médio, nove não aprendem o esperado em matemática e sete não sabem o mínimo de língua portuguesa. O dado se repete desde 1999, ou seja, toda a geração que tem entre 18 e 30 anos foi exposta a um ensino falido na adolescência – quem aprendeu, fugiu à regra.
Nesses números está contada a rede particular. Quando separadas apenas as escolas públicas, o poço é ainda mais fundo: só 5,2% teve resultado mínimo em matemática e 23,3% em língua portuguesa. Ainda que índices devam ser analisados com contexto, sobram motivos para duvidar da capacidade do ensino médio como o iG mostrou na série especial “A pior etapa da educação do Brasil”, em 2011.

De lá para cá houve anúncios que ganharam as manchetes. O Conselho Nacional de Educação aprovou um novo currículo no mesmo ano e, em 2012, o Ministério da Educação alardeou que faria propostas para colocá-las em prática. Na sala de aula, no entanto, a rotina segue igual. Em 2013 haverá nova Prova Brasil, avaliação que serve de base para os indicadores, e já se espera que os 12 anos de estagnação se transformem em 14.
Mesmo que alguns pais corujas pensem que suas crianças estarão entre as exceções, podem imaginar o quanto perderão ao estudar anos em grupos em que a maioria não consegue aprender o mínimo. Até quem pretende dar suporte aos filhos em casa ou aposta em reforços terá dificuldades maiores em fazê-lo nesta etapa diante da complexidade dos conteúdos.
O acompanhamento ao longo dos anos também permitiu saber que não adianta esperar que uma turma com mais conhecimentos básicos resulte em um ensino médio melhor. O fundamental, ainda que continue com problemas sérios, só melhorou nos índices desde 1999, mas quando as crianças chegam à adolescência empacam como as turmas anteriores.
Ou seja, o ensino médio, mais do que o infantil e o fundamental, depende da qualidade da escola. Isso passa por mudanças tão difíceis como a revisão do currículo ou a mudança na formação dos professores. É ou não motivo para quem tem criança pequena se preocupar desde agora?
Autor: Cinthia Rodrigues (Jornalista de Educação e mãe de alunos matriculados na rede pública de ensino).

terça-feira, 5 de março de 2013

10 dicas e 13 motivos para usar celular na aula

PATRÍCIA GOMES

Apesar de ainda haver alguma resistência aqui ou ali, os governos de todo o mundo estão cada vez mais atentos sobre a necessidade de se colocar as tecnologias móveis, como celulares e tablets, a serviço da educação. Mas como só vontade não garante bons resultados, a Unesco publicou um guiacom 10 recomendações políticas em que tenta ajudar governos a implantarem esses recursos nas salas de aula. E aos que ainda não estão 100% convencidos dos benefícios de um uso integrado da tecnologia com os objetivos pedagógicos, o guia, apresentado em Paris na semana passada durante a Mobile Learning Week, traz ainda 13 bons motivos para ter esse aliado na educação.

“Cada país está em um nível diferente no uso das tecnologias móveis em sala de aula. Por isso, é importante que cada um use o guia adaptado às suas necessidades locais”, diz Steve Vosloo, coordenador do projeto. O especialista conta que a ideia de lançar essas recomendações surgiu a partir da constatação de que, mesmo considerando o uso das tecnologias em sala de aula algo pedagogicamente importante, muitos governos não sabiam por onde começar. A questão do acesso já havia sido mais ou menos resolvida; o problema agora era dar significado a esse uso. Especialistas da Unesco espalhados pelo mundo começaram a elaborar um guia com orientações que servissem a qualquer governo, independentemente do grau de maturidade que o país estivesse nesse debate.

crédito burak çakmak / Fotolia

Até por isso, o documento começa com uma orientação que parece simples: ter políticas que incentivem o uso das tecnologias móveis em sala de aula. Isso pode querer dizer tanto criar políticas da estaca zero ou ainda atualizar políticas que foram criadas no momento em que as tecnologias móveis ainda não eram tão acessíveis. “As diretrizes políticas relacionadas ao aprendizado móvel que forem criadas devem estar em harmonia com as que já existirem no campo das TIC”, afirma a Unesco no documento.

Na sequência, o guia traz à luz a necessidade de se treinar professores e de fazer isso com o uso de tecnologias móveis, para que eles também se apropriem dessas ferramenta na vida deles. “No Brasil, os professores têm certa resistência em incorporar novas tecnologias. A sala de aula ainda é o lugar de desligar o celular”, afirma Rebeca Otero, coordenadora de Educação da Unesco no Brasil, que avalia que parte disso se deve ao fato de o professor ainda não estar completamente familiarizado com essas ferramentas. “Isso faz com que muitas oportunidades educacionais se percam, especialmente no ensino médio, época em que o aluno já está ligado e nas redes”, completa ela.

Outras recomendações presentes no documento dizem respeito à criação de conteúdo adequado e à promoção do uso seguro e saudável das tecnologias. Com essas orientações, acredita a Unesco, os governos estarão mais próximos de usufruir dos benefícios do aprendizado móvel, dentre eles ampliar o alcance e a equidade da educação e facilitar o aprendizado personalizado.

Confira, a seguir, um infográfico com as 10 recomendações e os 13 bons motivos para se usar tecnologias móveis em sala de aula.



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