Ao seguir tradição de gerações, meninas são mascaradas e criadas como meninos em busca de vantagens no Afeganistão
Mehran Rafaat, de 6 anos, é como muitas meninas de sua idade. Ela gosta de ser o centro das atenções e se frustra quando as coisas não saem da sua maneira. Como as suas três irmãs mais velhas, ela está ansiosa para descobrir o mundo fora da casa da família em um bairro de classe média de Cabul, capital afegã.
Mas quando sua mãe, Azita Rafaat, membro do Parlamento do país, veste suas crianças para a escola no período da manhã, há uma diferença importante. As irmãs de Mehran colocam vestidos pretos e lenços sobre a cabeça, amarrados firmemente sobre os seus rabos de cavalo. Mas Mehran veste calça verde, camisa branca e uma gravata. Em seguida, recebe um afago de sua mãe sobre o cabelo espetado, curto e preto. Depois disso, sua filha pode sair – como um menino afegão.
Foto: The New York Times
Mehran Rafaat (E), ao lado das irmãs Benafsha e Behishta, é criada como menino
Não existem estatísticas sobre quantas meninas são mascaradas como meninos afegãos. Mas quando questionados, afegãos de várias gerações muitas vezes contam a história de uma parente, amiga, vizinha ou colega de trabalho que cresceu disfarçada como um menino.
Para quem sabe de sua existência, essas crianças são muitas vezes mencionadas não como “filha” ou “filho” nas conversas, mas como “bacha posh”, que significa literalmente “vestida como um menino” em dari.
Através de dezenas de entrevistas realizadas ao longo de vários meses, onde muitas pessoas optaram por manter o anonimato ou utilizar apenas seu primeiro nome por medo de expor suas famílias, foi possível traçar um retrato dessa uma prática que se manteve escondida de estrangeiros. Mas esse hábito atravessa classe, educação, etnia e geografia, e resistiu até mesmo a muitas guerras e governos no Afeganistão.
Razões econômicas
As famílias afegãs têm muitas razões para fingir que suas meninas são meninos, incluindo a necessidade econômica, a pressão social para ter filhos e, em alguns casos, a superstição de que isso pode levar ao nascimento de um menino de verdade.
Foto: The New York Times
Mehran é filha de Azita Rafaat, membro do Parlamento, que também foi mascarada como menino na infância
Na falta de um filho, os pais decidem criar um, geralmente cortando o cabelo de uma filha e vestindo-a com roupas típicas de homens afegãos. Não existem proibições legais ou religiosas específicas contra a prática. Na maioria dos casos, um retorno à feminilidade ocorre quando a criança entra na puberdade. Os pais quase sempre tomam essa decisão.
Em um país onde os filhos são mais valorizados, já que na cultura tribal apenas eles podem herdar a riqueza do pai e passar seu nome, as famílias sem os meninos são alvo de desprezo. Mesmo um filho inventado melhora a situação da família, pelo menos por alguns anos.
Vantagens
Um "bacha posh" também pode receber educação mais facilmente, trabalhar fora de casa e até mesmo levar as irmãs em público, permitindo liberdades que são desconhecidas para as meninas em uma sociedade que segrega rigorosamente homens e mulheres.
Para alguns, no entanto, a mudança pode ser tão desorientadora quanto libertadora, colocando essas mulheres em um limbo entre os sexos. Shukria Siddiqui, criada como menino, mas então repentinamente mergulhada em um casamento arranjado, esforçou-se para se adaptar, tropeçando na burca e tendo dificuldades para falar com outras mulheres.
A prática pode datar de muitos séculos. Nancy Dupree, uma americana de 83 anos de idade, que passou a maior parte de sua vida como historiadora no Afeganistão, disse que não tinha ouvido falar do fenômeno, mas lembrou de uma fotografia do início de 1900 pertencente à uma coleção privada de um membro da família real afegã.
Nela, mulheres vestidas como homens formavam a guarda do harém do rei Habibullah. A razão: as mulheres do harém não podiam ser protegidas por homens, que representavam uma ameaça para elas, mas não poderiam ser vigiadas por mulheres também.
"A segregação exige criatividade", disse Nancy. "Essas pessoas têm uma capacidade de enfrentamento surpreendente".
Foto: Fundação Dupree/ The New York Times
Foto histórica mostra que mulheres vestidas como homens formavam a guarda do harém do rei Habibullah
É uma crença comum entre os afegãos menos educados que a mãe pode determinar o sexo do feto, por isso ela é responsabilizada se ela dá à luz uma filha. Vários médicos afegãos e profissionais de saúde de todo o país relatam ter testemunhado o desespero das mulheres quando dão à luz filhas e que a pressão para gerar um filho alimenta a prática.
"Sim, isso não é normal para você", disse Azita Rafaat. "E eu sei que é muito difícil para você acreditar que uma mãe faria essas coisas com sua filha. Algumas coisas que acontecem no Afeganistão não são imagináveis para um povo ocidental".
*Por Jenny Nordberg
The New York Times
Fonte: Portal iG
Mehran Rafaat, de 6 anos, é como muitas meninas de sua idade. Ela gosta de ser o centro das atenções e se frustra quando as coisas não saem da sua maneira. Como as suas três irmãs mais velhas, ela está ansiosa para descobrir o mundo fora da casa da família em um bairro de classe média de Cabul, capital afegã.
Mas quando sua mãe, Azita Rafaat, membro do Parlamento do país, veste suas crianças para a escola no período da manhã, há uma diferença importante. As irmãs de Mehran colocam vestidos pretos e lenços sobre a cabeça, amarrados firmemente sobre os seus rabos de cavalo. Mas Mehran veste calça verde, camisa branca e uma gravata. Em seguida, recebe um afago de sua mãe sobre o cabelo espetado, curto e preto. Depois disso, sua filha pode sair – como um menino afegão.
Foto: The New York Times
Mehran Rafaat (E), ao lado das irmãs Benafsha e Behishta, é criada como menino
Não existem estatísticas sobre quantas meninas são mascaradas como meninos afegãos. Mas quando questionados, afegãos de várias gerações muitas vezes contam a história de uma parente, amiga, vizinha ou colega de trabalho que cresceu disfarçada como um menino.
Para quem sabe de sua existência, essas crianças são muitas vezes mencionadas não como “filha” ou “filho” nas conversas, mas como “bacha posh”, que significa literalmente “vestida como um menino” em dari.
Através de dezenas de entrevistas realizadas ao longo de vários meses, onde muitas pessoas optaram por manter o anonimato ou utilizar apenas seu primeiro nome por medo de expor suas famílias, foi possível traçar um retrato dessa uma prática que se manteve escondida de estrangeiros. Mas esse hábito atravessa classe, educação, etnia e geografia, e resistiu até mesmo a muitas guerras e governos no Afeganistão.
Razões econômicas
As famílias afegãs têm muitas razões para fingir que suas meninas são meninos, incluindo a necessidade econômica, a pressão social para ter filhos e, em alguns casos, a superstição de que isso pode levar ao nascimento de um menino de verdade.
Foto: The New York Times
Mehran é filha de Azita Rafaat, membro do Parlamento, que também foi mascarada como menino na infância
Na falta de um filho, os pais decidem criar um, geralmente cortando o cabelo de uma filha e vestindo-a com roupas típicas de homens afegãos. Não existem proibições legais ou religiosas específicas contra a prática. Na maioria dos casos, um retorno à feminilidade ocorre quando a criança entra na puberdade. Os pais quase sempre tomam essa decisão.
Em um país onde os filhos são mais valorizados, já que na cultura tribal apenas eles podem herdar a riqueza do pai e passar seu nome, as famílias sem os meninos são alvo de desprezo. Mesmo um filho inventado melhora a situação da família, pelo menos por alguns anos.
Vantagens
Um "bacha posh" também pode receber educação mais facilmente, trabalhar fora de casa e até mesmo levar as irmãs em público, permitindo liberdades que são desconhecidas para as meninas em uma sociedade que segrega rigorosamente homens e mulheres.
Para alguns, no entanto, a mudança pode ser tão desorientadora quanto libertadora, colocando essas mulheres em um limbo entre os sexos. Shukria Siddiqui, criada como menino, mas então repentinamente mergulhada em um casamento arranjado, esforçou-se para se adaptar, tropeçando na burca e tendo dificuldades para falar com outras mulheres.
A prática pode datar de muitos séculos. Nancy Dupree, uma americana de 83 anos de idade, que passou a maior parte de sua vida como historiadora no Afeganistão, disse que não tinha ouvido falar do fenômeno, mas lembrou de uma fotografia do início de 1900 pertencente à uma coleção privada de um membro da família real afegã.
Nela, mulheres vestidas como homens formavam a guarda do harém do rei Habibullah. A razão: as mulheres do harém não podiam ser protegidas por homens, que representavam uma ameaça para elas, mas não poderiam ser vigiadas por mulheres também.
"A segregação exige criatividade", disse Nancy. "Essas pessoas têm uma capacidade de enfrentamento surpreendente".
Foto: Fundação Dupree/ The New York Times
Foto histórica mostra que mulheres vestidas como homens formavam a guarda do harém do rei Habibullah
É uma crença comum entre os afegãos menos educados que a mãe pode determinar o sexo do feto, por isso ela é responsabilizada se ela dá à luz uma filha. Vários médicos afegãos e profissionais de saúde de todo o país relatam ter testemunhado o desespero das mulheres quando dão à luz filhas e que a pressão para gerar um filho alimenta a prática.
"Sim, isso não é normal para você", disse Azita Rafaat. "E eu sei que é muito difícil para você acreditar que uma mãe faria essas coisas com sua filha. Algumas coisas que acontecem no Afeganistão não são imagináveis para um povo ocidental".
*Por Jenny Nordberg
The New York Times
Fonte: Portal iG
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ResponderExcluirPor ser muito antigo o quadro de comentário do blog, ele ainda apresenta a opção comentar anônimo, mas, com a mudança na legislação
....... NÃO SERÁ PUBLICADO COMENTÁRIO ANÔNIMO....