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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

"Não existe criação de gênero neutro", diz "pai de saias"


Em entrevista exclusiva ao Delas, Nils Pickert, que foi chamado de "pai do ano" por internautas do mundo todo, explica o que o levou a usar saias em público para apoiar o filho
Clarissa Passos- iG São Paulo
 
 
 
Reprodução/Emma.de
Nils e o filho na cidade onde moram: pai decidiu usar saias para apoiar o menino
 
 
"Um vestido é apenas um vestido". Esta é a opinião de Nils Pickert, 32 anos, escritor nascido em Berlim. Casado, está com a esposa há 16 anos, com quem tem dois filhos: uma menina de sete e um menino de cinco anos. Há pouco menos de um ano e meio a família se mudou para uma pequena cidade ao sul da Alemanha e Nils se tornou famoso mundialmente, embora tenha conseguido manter sua privacidade. A celebridade veio por conta de um artigo escrito para a revista alemã EMMA e replicado por sites do mundo todo. Nele, Nils explica sua decisão de passar a usar saias em público como forma de apoiar o filho, que gosta de usar vestidos e pintar as unhas.
"Neutro" não é uma opção. Devemos procurar o "justo" em vez do "neutro".
Criticado por muitos e chamado de "pai do ano" por outros, Nils explica suas razões em entrevista exclusiva ao Delas, realizada por e-mail.
iG: Você é adepto da criação de gênero neutro?
Nils Pickert: Não existe essa coisa de "criação de gênero neutro". Se eu tentasse criá-lo dessa maneira, estaria levando-o ao igualitarismo, e não à igualdade. O igualitarismo nega a existência das diferenças. A igualdade defende que todos devem ter direitos iguais. Eu sou a favor da igualdade, o que significa ter os mesmos direitos de escolha não apesar, mas por causa das diferenças. Sempre haverão gêneros diferentes e identidades diversas. "Neutro" não é uma opção. Devemos procurar o "justo" em vez do "neutro".
iG: Quantos filhos você tem e qual a idade deles?
Nils Pickert: Tenho uma filha de sete e um filho com cinco anos.
iG: Quanto tempo você morou em Berlim?
Nils Pickert: Nasci e fui criado lá. Meus filhos também nasceram lá. Nos mudamos há 16 meses e, antes disso, vivemos sempre em Berlim.
iG: Desde quando seu filho mostrou interesse por vestidos, esmaltes e outros elementos culturalmente associados ao feminino?
Nils Pickert: Não criamos um ambiente em que ele precisasse identificar certas coisas como masculinas ou femininas. Por que deveríamos fazê-lo? Algumas pessoas gostam de esmaltes, como meu filho e a irmã dele. E há pessoas que detestam esmaltes, como a mãe dele. Usar saias ou gostar de coisas cor de rosa não é feminino por si só. Agir de forma áspera e ser durão não é masculino por si só. Somos nós que atribuímos estes valores.
“Usar saias ou gostar de coisas cor de rosa não é feminino por si só. Agir de forma áspera e ser durão não é masculino por si só. Somos nós que atribuímos estes valores.”
iG: Como você se sentiu ao perceber que ele gostava de usar saias? Você ficou preocupado? Pensou no que as pessoas iriam dizer?
Nils Pickert: Não fiquei preocupado, não há nada para se preocupar. Ele é meu filho e está tentando viver a vida da melhor maneira que pode. Se ele quiser fazer aulas de boxe, tudo bem! Se quiser dançar balé, tudo bem também. Mas é claro que pensei no que as pessoas iam dizer para mim. Todo mundo tem o direito de criticar minhas decisões. Sou eu, e não ele, quem está tomando uma posição. Ele só quer usar vestidos de vez em quando. Já eu estou tentando garantir que todos ao nosso redor entendam que ele não está sozinho e que eu estou aqui para apoiá-lo. Para isso, estou disposto a fazer papel de bobo -- sou pai dele.
iG: Quando pequeno, você também gostava de vestidos ou outros elementos associados ao feminino?
Nils Pickert: Não, nunca.
iG: Muitas pessoas criticaram sua atitude argumentando que, permitindo a seu filho experimentar elementos associados ao feminino, você está deixando de ensiná-lo os códigos sociais, função fundamental dos pais. O que você acha?
Nils Pickert: Isso é um argumento cínico e um pouco covarde. Ele tem total capacidade de entender os códigos sociais. Mas, acima disso, ele é capaz de distinguir o que é superficial e o que é mais profundo. Um vestido é só um vestido. Ser mau ou violento, isso sim é um problema. Talvez ele deixe de usar vestidos um dia. Mas sempre haverá gente que, por ser diferente, vai precisar da compreensão e da paciência dele. As pessoas me perguntam porque não poupo meu filho dos olhares de reprovação simplesmente dizendo-o para não sair mais de vestido. Prefiro poupá-lo de um julgamento cruel e odioso da sociedade, e só tem uma forma de fazer isso: mudando-a. Não porque somos diferentes ou párias, mas porque poderíamos sê-los. Não lidar com questões de gênero não nos dá o direito de julgar quem é. Nos dá o privilégio de ajudar quem está às voltas com estas questões.
iG: Você acha que brincar ou experimentar papéis associados ao feminino pode influenciar na sexualidade do seu filho?
Nils Pickert: A sexualidade do meu filho não é problema meu. Não sou dono do futuro do meu filho. O futuro dele é todo dele, para ele viver -- eu sou abençoado por poder acompanhá-lo.
 

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