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quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Nova relação passa por investimento e educação


por Humberto Márquez, da IPS

A crise que vive a Europa pode ser uma oportunidade para América Latina e Caribe redesenharem uma relação birregional assentada sobre a educação superior e os investimentos com ênfases social e ambiental, segundo o Conselho Ministerial do Sistema Econômico Latino-Americano (Sela), composto por 28 Estados da região. Este órgão completou em Caracas, no dia 19, a 38ª reunião anual de seu Conselho, instância que atua como sua máxima autoridade. América Latina e Caribe “deveriam ir a dois nichos vitais: investimento que favoreça a sustentabilidade social e ambiental, e relações mais intensas em educação superior, ciência e tecnologia”, disse à IPS o argentino Carlos Quenán, responsável pelo estudo sobre as relações com a União Europeia, que foi a referência para o debate. Criado em 1975 com a finalidade de concertamento e cooperação econômica, o Sela aproveitou este Conselho para apresentar sua perspectiva sobre a crise europeia com vistas à cúpula entre as duas regiões, que acontecerá em janeiro de 2013, em Santiago, no Chile.
“Não cabe uma perspectiva apocalíptica, de acreditar que a Europa está muito mal, nem a América Latina e o Caribe podem cair na autocomplacência e pensar que, por resistir à crise global, não precisa de ajuda”, alertou Quenán, vice-presidente do Instituto das Américas, da França. Outro especialista argentino, Roberto Lavagna, ministro da Economia entre 2002 e 2005, afirmou que “o resto da Europa faz mal em tentar cumprir as exigências da Alemanha e do Fundo Monetário Internacional: os cortes que destroem o poder de compra na população são recessivos e não dão resultado em equilíbrios fiscais”.

Quenán evocou uma frase do ex-primeiro-ministro espanhol, Felipe González (1982-1996), para quem “a austeridade rígida leva à morte”, a Europa chegará ao novo encontro com América Latina e Caribe apenas iniciando medidas para atender a crise, baseadas em “políticas de austeridade que generalizam e impedem no momento uma recuperação”, afirmou. A Cúpula de Santiago será a sétima do mecanismo iniciado em 1999, no Rio de Janeiro, e formatada como a primeira entre a União Europeia e a nova Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), que reúne todos os países do hemisfério com exceções de Canadá e Estados Unidos.

O estudo contém um rosário de assertivas que deixam mal a situação europeia com vistas à economia global: uma moeda, o euro, única que não tem um prestamista de última instância, falta de disciplina macroeconômica, superendividamento, recessão, paralisação da produtividade e problemas de governança. Segundo Quenán, “persistem todos os fatores que afetam a economia europeia, e no curto e médio prazos seu crescimento será medíocre, no melhor dos casos”.

Quanto à América Latina e o Caribe, a crise da Europa incidiu sobre quatro grandes campos de sua atividade econômica: investimento, comércio, remessas e Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD). Embora a UE se ufane de ser o primeiro investidor na região, com um acumulado de US$ 406 bilhões em 2009, na última década esse investimento, com média em torno dos US$ 30 bilhões anuais, apresentou elevada volatilidade. Como contrapartida, América Latina faz um aporte positivo para equilibrar os balanços consolidados das casas matrizes europeias, e, no caso da Espanha, foi nos últimos anos a principal fonte de recursos para numerosas empresas.

A importância da Europa como sócia comercial da América Latina e do Caribe diminuiu. Era o destino de 24,6% das exportações latino-americanas e caribenhas em 1990 e passou para 13,6% em 2011. Por outro lado, a China, décimo-sétimo destino das exportações da América Latina e do Caribe há 20 anos, hoje é o terceiro, e recebe 9% das exportações totais da região. O intercâmbio também se mantém assimétrico e concentrado: mais de 90% dos produtos europeus que a região importa são bens industrializados e a metade com alto conteúdo tecnológico, enquanto 60% do que América Latina e Caribe vendem à Europa é matérias-prima ou manufaturas escassamente elaboradas.

Os grandes sócios comerciais da Europa são apenas cinco países: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e México, com mais de 75% do comércio desde ou para a UE. Ao mesmo tempo, cinco europeus (Alemanha, Espanha, França, Grã-Bretanha e Itália) absorvem quase 60% das vendas latino-americanas. Este panorama pode acentuar-se com a crise, traduzida em queda da economia europeia e na valorização das moedas em países latino-americanos.

As remessas de migrantes também caem. A Espanha, segundo provedor de remessas para a região, depois dos Estados Unidos, enviou em 2010 à Colômbia 9,5% menos fundos do que em 2008; para o Equador 13% menos e para a Bolívia a queda foi de 16%. Quanto à ajuda ao desenvolvimento, já se descarta que a UE possa chegar em 2015 à meta de que a AOD represente 0,7% do produto interno bruto, pois atingiu apenas 0,42% em 2010, quando deveria estar em 0,56%.

Com este panorama o estudo do Sela propõe intensificar os planos regionais de cooperação e integração e avaliar o fato após a Cúpula de 2010 com a UE, em Madri, que propôs trabalhar em acordo temas de ciência e tecnologia, inovação e desenvolvimento sustentável. Quénan falou da necessidade de se avançar na busca de consenso e sinergias sobre um primeiro nicho de investimentos para a sustentabilidade social e ambiental.

“A UE, com suas dificuldades, é a região do mundo que gera a maior quantidade de patentes em tecnologias ambientais, e América Latina e Caribe são uma região que precisa preservar seu meio ambiente ao mesmo tempo em que aproveita sua riqueza em biodiversidade”, afirmou Quenán. O outro nicho é o da educação superior, ciência, tecnologia e inovação. Durante a exposição do estudo, o mexicano José Rivera, secretário permanente do Sela, apresentou alguns dados como exemplo: em 2001, toda a América Latina e o Caribe apresentaram 7.800 pedidos de patentes, enquanto a Coreia do Sul sozinha apresentou 177.185.

“América Latina e Caribe têm uma educação superior estendida, com numerosas universidades e matrículas, mas a qualidade é algo diferente. E, em matéria de inovação tecnológica, a Europa, apesar da crise, continua sendo uma grande potência, enquanto nossa região tem um grande déficit a superar”, apontou Quenán. As iniciativas do Sela serão levadas a Santiago pelo seu novo secretário permanente, o venezuelano Roberto Guarnieri, eleito no dia 19 para substituir Rivera, no cargo desde 2008. Sob seu mandato, o órgão produziu dezenas de estudos a título de insumos para entidades da região em temas de cooperação. Envolverde/IPS

 

 

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