Bons
conselhos para conseguir conviver em paz com amigos, parentes ou colegas de
religiões e crenças diferentes das suas
Julia
Batista, especial para o iG SP
Não
misture amizade e religião, a combinação nunca dá certo
A
velha máxima “futebol e religião não se discutem” deveria pautar qualquer
conversa, seja em família, entre amigos e colegas de trabalho. Avós e manuais
de comportamento desde sempre ensinam isso.
E
especialistas reforçam: proselitismo fora da comunidade religiosa é
deselegante, chato e inconveniente. E pode até caracterizar crime. “As pessoas
precisam se convencer da importância de respeitar a crença de cada um”, afirma
a consultora de etiqueta Dóris Azevedo, autora de “Etiqueta e
Contra-etiqueta ”.
Não
se intimide numa situação constrangedora envolvendo proselitismo ou
evangelização
Tolerância
religiosa começa dentro de você. Respeite seu direito de ser diferente e não
tenha medo de assumir sua liberdade mesmo diante dos amigos mais íntimos.
Como
lidar então com aquela amiga, parente ou colega que insiste na pregação?
“Você
tem o direito de dizer clara e firmemente: ‘eu não quero falar sobre o
assunto’, mas também pode optar por uma brincadeira para tornar um pouco mais
‘light’ a 'saia justa'”, aconselha a consultora.
Ela
conta que já passou por este tipo de situação algumas vezes. Em uma delas, por
exemplo, Dóris estava doente na cama de um hospital, quando uma senhora se
aproximou com a Bíblia. A reação da consultora foi tão imediata quanto
inesperada. Ela gritou “Socorro, estão me convertendo!”. Todos os presentes
riram e o episódio virou piada
.
Intolerância
religiosa não é só um constrangimento, pode ser crime
Brincadeira à parte, o assunto é sério. Liberdade religiosa existe e está
garantida na Constituição, mas na prática isso nem sempre acontece. E os
estudiosos estão preocupados com o avanço de ideias menos liberais e
intolerantes. “A liberdade religiosa está ameaçada no País e a justiça
religiosa também”, afirma a antropóloga Débora Diniz, autora do livro
“ Laicidade e Ensino Religioso no Brasil ”.
“Segmentos
religiosos mais intolerantes perseguem outras religiões”, acrescenta Ivanir dos
Santos, interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa .
A
Comissão, organizada pela sociedade civil e sem vínculo com intituições
governamentais, promove, desde 2008, a Caminhada contra Intolerância
Religiosa . Ela acontece na praia de Copacabana, no Rio, no segundo
domingo de setembro. A última edição reuniu cerca de 180 mil pessoas, segundo
Ivanir. O resultado pode ser visto no livro, lançado em janeiro,
“ Caminhando a gente se entende ”, que reúne fotos das caminhadas e
textos de representantes de diversas crenças.
Mesmo
a Constituição Brasileira sendo laica e protegendo a liberdade de expressão, o
credo e o não-credo, a intolerância religiosa cresce e tem marginalizado
determinadas crenças e seus seguidores, em especial as religiões de matriz
afro-brasileira, como o candomblé e a umbanda.
“Politicamente,
existe um favorecimento ao cristianismo, que oprime e impede que as minorias
religiosas e as organizações não-religiosas dedicadas à difusão de uma cultura
de tolerância ocupem espaços e tenham voz”, analisa Débora.
Para
a antropóloga, a TV acaba favorecendo essa visão. As religiões petencostais e
neopetencostais, estão se firmando no Brasil como as “religiões eletrônicas”,
por causa do espaço que foram conquistando na TV aberta, em rádios e jornais.
Para a antropóloga, esses programas religiosos são uma 'ameaça à liberdade de
expressão'.
“As
pessoas consomem, prioritariamente, a programação da TV aberta, concedida pelo
estado laico a alguns grupos de comunicação, que vendem seus espaços para as
igrejas milionárias. Isso quando as próprias organizações religiosas não acabam
comprando diretamente canais de televisão. O público fica sem alternativa e sem
acesso à informação de qualidade e, consequentemente, sem ferramentas para a
formação de opinião”, reflete.
No
dia a dia, a melhor forma de exercitar a tolerância religiosa é abrir espaço
para a liberdade de crença e deixar cada um viver sua fé.
Os
7 mandamentos da boa convivência religiosa:
Trate os outros como você quer ser tratado
Este é o principal ensinamento de qualquer religião, credo ou filosofia. Não
quer ser desrespeitado por suas escolhas, então não desrespeite o próximo.
“Respeite para ser respeitado é a principal dica”, aconselha Dóris.
Respeite
a crença religiosa dos outros
Conseguir aguentar o fato de que os outros podem ter opiniões diferentes das
nossas é pré-requisito para a boa convivência humana . Lembra do
início da matéria? Futebol e religião não se discute. No caso da religião, não
se discute e se respeita. “Tolerância uma hora ou outra pode se tornar
intolerância. Deve haver respeito”, conclui Pai Gumarães de D’Ogum, presidente
da Associação Brasileira de Templos de Umbanda e Candonblé.
Não
brinque nem desrespeite as práticas religiosas dos outros.
Sua amiga muçulmana cobre-se com um véu? Não cabe a você fazer piada, criticar
ou, pior ainda, fazer comentários maldosos sobre essa prática. No máximo,
tente entender o ponto de vista dela. Talvez você até se surpreenda.
Cuidado
com a forma como você se aproxima de símbolos e rituais de outras
religiões.
Você pode até achar que não existe diferença nenhuma entre a imagem de Nossa
Senhora, vestida de azul dentro do oratório que enfeita a escrivaninha da sua
colega, e qualquer outro objeto ou enfeite, mas existe e é grande. Evite
comentários, na dúvida, nem toque. Vale perguntar, desde que a curiosidade seja
legítima, sem resquício nenhum de brincadeira.
Não
deixe diferenças religiosas afastarem você da sua família.
Família não tem que comungar a mesma religião, admita que num país como o
nosso, de maioria cristã, mas onde o sincretismo é forte, cada membro da
família pode serguir um rumo diferente e conviver em harmonia dentro de padrões
pré-estabelecidos de comum acordo, por exemplo, no Natal segue-se a tradição
cristã, no Ano-novo a família se reúne para levar flores para Yemanja.
Monitore o ensino religioso do seu filho.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) tornou obrigatório o ensino
religioso nas escolas públicas brasileiras. Isso favorece a tal discussão de
ideias e a troca de informações, mas também pode criar espaços permeáveis ao
proselitismo. Converse com seu filho sobre isso
Evite
enviar e repassar correntes religiosas por email e redes sociais
Bloquear o amigo virtual, deletar emails e cancelar assinatura são opções para
não receber mensagens religiosas e de pregação.
Intolerância
religiosa é crime
A Lei n.º 7.716/89 (Lei Caó) do Código Penal diz : a) ofender alguém com
xingamentos relativos à sua raça, cor, etnia, religião ou origem. (Art. 140 do
Código Penal (injúria), com a qualificadora do §3º. Pena: um a três anos de
reclusão). Inclui-se aqui o ato de ofender alguém com xingamentos à sua
religião.
Em São Paulo, ocorrências de natureza preconceituosa podem ser registradas na
Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância. A ONG Liberdade
Religiosa auxilia vítimas de intolerância religiosa a procurarem seus
direitos