O artigo é de um jornal de Portugal onde é analisada a indecisão dos portugueses sobre em quem votar na próxima eleição.
O texto é um bom pretexto para reflexão sobre os caminhos da Política como podemos observar no trecho destacado:
...O português "indeciso" não deixa de saber o que quer. Pode, por ira, desgosto, vingança ou desdém momentâneos, ausentar-se dos seus gostos e preferências. O absentismo é uma forma superior de protesto. Perante as combinações, os arranjos políticos vis, a mentira organizada e proliferante, o português compreendeu que o voto já não é a arma do povo...
O poder e a indecisão
por BAPTISTA-BASTOS
DN Opinião
Diz-se e escreve-se, por aí, que quarenta por cento de portugueses estão indecisos sobre quem votar. Creio, no entanto, que nesta análise (chamemos-lhe assim) reside algo de equívoco e de ambíguo. Na verdade, não há indecisos: há, isso sim, decisões voláteis. Cada um de nós, por orientação própria ou alheia, foi educado, "formatado" desta ou daquela maneira. Foucault, em Dits et Écrits, esclareceu muito bem essas relações de poder e de submissão, que talvez se possam sintetizar na existência das dinastias de operários, de economistas, de "gestores", de arquitectos.
As famílias de tipógrafos, de advogados, de médicos que se continuaram, são quase como as famílias de benfiquistas, de portuenses, de sportinguistas, de belenenses, que reelaboram os conceitos de pura vontade racional. O português "indeciso" não deixa de saber o que quer. Pode, por ira, desgosto, vingança ou desdém momentâneos, ausentar-se dos seus gostos e preferências. O absentismo é uma forma superior de protesto. Perante as combinações, os arranjos políticos vis, a mentira organizada e proliferante, o português compreendeu que o voto já não é a arma do povo.
As técnicas e as tecnologias que asseguram a coerção e os processos através dos quais as nossas vontades podem ser modificadas e alteradas desestabilizam o modo de ser e o comportamento de cada qual. Só assim se explica a manutenção no poder de grupos, clubes e partidos que têm conduzido as sociedades ao naufrágio. Portugal é um dos exemplos típicos.
Como em tudo o que se chama, agora, "identidades modernas", a verdade é um imbróglio, um enredo difícil de desembaraçar, e um modo de viver que se tornou aceitável e quase indiscutível. O diz que disse e não disse envolve práticas concretas, nas quais os mecanismos do poder foram, há muito, removidos da moral e da ética.
Temos de aceder (mas não aceitar) o torto princípio de que em nada existe independência, imparcialidade e objectividade. O carácter transversal e imediato desta anomalia invadiu, endemicamente, a nossa sociedade. O caso Sócrates pode ser "de estudo"; porém, Pedro Passos Coelho é um assunto de Estado: não possui ideias de seu, apenas ocorrências, escoradas em minúsculos incidentes. E está dito.
O poder, entre estes dois homens, é uma questão de relação subjectiva, um jogo comum de pequenas teimosias e de declaradas ambições. A tal "indecisão" dos portugueses é a imagem devolvida das pessoais indecisões daqueloutros. As fragilidades e os medos, os receios e as tibiezas são-lhes semelhantes. Sócrates, sem o suporte do aparelho e o fanatismo dos apaniguados pouco mais é do que um ser comum. Passos Coelho procura, entre os seus, que o execram ou desdenham, os sentimentos efusivos que fizeram de Sócrates o que foi. E já não é. Eles não criaram a "indecisão". Eles são a "indecisão".
Espaço para leitura, reflexão e debate sobre as várias facetas que compõem a totalidade da existência.
Quem sou eu
- Maria,viajante do Universo de passagem pelo planeta Terra
- "Quando começares a tua viagem para Ítaca, reza para que o caminho seja longo, cheio de aventura e de conhecimento...enquanto mantiveres o teu espírito elevado, enquanto uma rara excitação agitar o teu espírito e o teu corpo." ...Konstantinos Kaváfis,trad.Jorge de Sena in Ítaca
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Por ser muito antigo o quadro de comentário do blog, ele ainda apresenta a opção comentar anônimo, mas, com a mudança na legislação
....... NÃO SERÁ PUBLICADO COMENTÁRIO ANÔNIMO....
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..."Temos de aceder (mas não aceitar) o torto princípio de que em nada existe independência, imparcialidade e objectividade. O carácter transversal e imediato desta anomalia invadiu, endemicamente, a nossa sociedade...".
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