Lei criada para proteger a mulher contra agressões completa cinco anos e abre espaço para reflexão
*Paula Miraglia
O aniversário da Lei Maria da Penha abre espaço para uma reflexão sobre as transformações promovidas pela legislação, bem como sobre os avanços necessários para a sua implementação integral. O aparato legal veio dar impulso ao enfrentamento e à repressão da violência contra a mulher, assim como ampliou o espaço institucional dedicado à questão. Paralelamente, o fortalecimento da sociedade civil estabeleceu um ambiente de mobilização mais robusto, capaz de dar visibilidade à causa.
A recente onda de manifestações em todo o País reagindo à frase infeliz de um humorista comentando o estupro, seguida de um pedido de inquérito por parte do Ministério Público, são boas ilustrações de como os níveis de tolerância na esfera pública estão reduzidos. A violência contra a mulher não é vista mais como algo aceitável, muito menos como assunto para piada. Nada disso é irrelevante num País onde até muito pouco tempo a indiferença ou a impunidade eram a regra.
Entretanto, os números alarmantes e os casos graves, reportados diariamente, mostram como abusos ainda fazem parte do cotidiano de muitas mulheres e adolescentes brasileiras.
Há um diagnóstico compartilhado por especialistas, que enxergam nos obstáculos no Sistema de Justiça os impedimentos à aplicação integral da lei. Um número insuficiente de juizados especiais, por exemplo, ou mesmo o pouco preparo da polícia e dos juízes estaria contribuindo para que a Lei Maria da Penha não fosse capaz de proteger as mulheres como deveria.
Sabemos que a ineficácia do Judiciário não elege o gênero como requisito. O número abusivo de presos provisórios no País é apenas um dos exemplos nesse sentido. Dessa forma, ainda que aprimorar o Sistema de Justiça seja fundamental, o combate à violência contra a mulher encontra hoje outros desafios.
A prevenção da violência contra a mulher não pode ser uma agenda política exclusiva das mulheres. Deve ser pauta prioritária das políticas de segurança pública, das políticas de saúde, educação, urbanismo, empreendedorismo, e assim por diante. Numericamente, somos hoje mais mulheres do que homens no Brasil. Nada mais justo que as políticas públicas estejam todas alinhadas com o tema.
Além disso, não podemos nos furtar da pergunta: como lidar com o agressor? Num momento em que o País começa a se propor uma reflexão mais aprofundada sobre as alternativas à prisão para diversos crimes, soa anacrônico e até mesmo pouco promissor afirmar que prender o homem agressor seria a solução para o problema.
A violência contra a mulher se dá na relação. Relações inegavelmente desiguais, covardes, muitas vezes pautadas pela assimetria de poder. Mas pressupõe, necessariamente, interação.
Assim, se a Lei, como já afirmou a própria Maria da Penha, diz respeito às mulheres, a política pública de prevenção não tem outra escolha a não ser tratar de mulheres e homens.
*Antropóloga analisa segurança pública, justiça e cidadania
Fonte: Portal iG
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