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sábado, 30 de junho de 2012

Sara Winter e o FEMEN na Ucrânia

Com pequeno atraso registramos a participação de uma seguidora de nosso blog Ledjane Sara nos protestos do Femen na Eurocopa. Nossa querida Ledjane Sara ou Sara Winter retorna em breve ao Brasil e está bem segundo informações na sua  página do facebook. Críticas à parte e sem moralismo piegas Sara Winter é vanguarda e o mundo necessita dos ponta de lança!

Conheci Sara em 2011 quando ela esteve aqui em Araraquara com meu sobrinho Rafael para assistir à ópera O Barbeiro de Sevilha numa adaptação infantil. Confesso que me encantei com a beleza, brejeirice e inteligência de Sara. Só não sabia de sua consciência política e ativismo.

Quero externar  à Sara Winter aqui no blog o meu profundo respeito e admiração por  sua coragem e valentia. O mundo precisa de milhões de "Saras".

Breve informação

O FEMEN (em ucraniano: Фемен) é um grupo ucraniano de protesto, fundado em 2008 por Anna Hutsol, com base na cidade de Kiev. A organização tornou-se notória por protestar em topless para contra temas como o turismo sexual, o sexismo e outros males sociais.

Brasileira vai para a Ucrânia protestar sem roupa e acaba presa
Acompanhada por uma ucraniana, Sara Winter pintou o corpo e protestou durante a Eurocopa.


http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL1681136-15605,00.html

Uma brasileira foi presa neste domingo (24), na Ucrânia, durante um protesto na Eurocopa. Ela saiu do Brasil na quinta-feira, rumo a Kiev, para se juntar ao grupo Femen: as militantes feministas que ficaram famosas por protestarem de seios de fora pelos direitos das mulheres.

Na Eurocopa, os protestos das mulheres de topless contra o turismo sexual estão chamando tanto a atenção quanto o futebol. Elas são integrantes do grupo Femen, que surgiu em 2008, na Ucrânia, e acaba de ganhar um reforço brasileiro: a paulista Sara Winter, de 20 anos.

“Fiz um protesto aqui durante a virada cultural. Elas viram, acharam o máximo e me convidaram. Minha família é bem conservadora. Mas sei que eles apoiam de coração. Eles têm muito medo do que pode acontecer comigo, do que pode ser do meu futuro”, conta.

Os protestos do Femen, vira e mexe, acabam com as meninas detidas pela polícia. Mesmo sabendo dos riscos, Sara embarcou na quinta-feira (21) para a Ucrânia.

“Nunca saí do Brasil. Nunca imaginei que o primeiro país para o qual eu fosse seria a Ucrânia”, comentou.

Depois de várias escalas, ela chegou a Kiev só na noite deste sábado (23). Mas o cansaço de quem viajou dias não transparecia. A cara doce escondia uma vontade firme de participar, de protestar. Mas ela não sabia se isso seria possível porque de manhã já tinha acontecido um protesto e três mulheres estavam presas.

“Eu espero que aconteça hoje porque estou super animada”, disse.

Sara foi recebida com cartazes que mostravam uma união Ucrânia-Brasil e o protesto tem uma raiz comum. Nas arquibancadas, em todos os jogos, se podem ver mulheres muito bonitas. As ucranianas, como as brasileiras, têm uma fama merecida.

Mas turismo sexual é um problema comum: na cidade se vê muita prostituição e isso aumentou durante a Eurocopa.

Neste domingo (24), em frente ao estádio, os torcedores esperavam o jogo e um desses clubes eróticos botou o show no meio da rua. Enquanto isso, Sara finalmente recebeu a notícia de que iam tentar aproveitar o jogo entre Itália e Inglaterra, em Kiev, para mais uma manifestação.

A ucraniana Sacha explicou para Sara como lidar com a polícia, como se debater. Ensaiaram os gritos na esperança de que teriam tempo para isso. Sara então teve o corpo pintado com a frase: “Estuprada pelo euro”.

Até agora, desde o início da Eurocopa, as mulheres da Femen já fizeram quatro protestos. Dois eles, em outras duas vezes, elas foram presas antes.

Hora de ir à luta: tirar a roupa e se borrar de vermelho simulando sangue. Levantar o cartaz é relativamente rápido. As duas berravam contra o euro e conseguiram em pouco tempo chamar a atenção de toda a mídia internacional.

O protesto continuava, e elas se dirigiam para cada vez mais perto do estádio. Sacha tentou subir em uma mesa e foi derrubada. A polícia chegou rasgando e prendeu as duas.

Sara gritava que era do Brasil, mas os policiais ucranianos não se sensibilizaram. Ela ainda tentou se agarrar com as pernas em uma grade, mas logo foi arrancada de lá. Arrastadas para longe do público e das câmeras. Presas, Sara e Sacha estão passando a noite na cadeia

sexta-feira, 29 de junho de 2012

EUA: Antes uma forma de arte, escrita cursiva agora é um mistério

Com ascensão teclados de computadores e smartphones, morte progressiva de letras elaboradas revela desafios como a falsificação

The New York Times
Durante séculos, a escrita cursiva foi uma arte. Para um número crescente de jovens, ela é um mistério. As letras sinuosas do alfabeto cursivo, que enfeitaram inúmeras cartas de amor, importantes contratos e pôsteres acima da lousa em salas do ensino fundamental estão seguindo o caminho da pena e do tinteiro. Com os teclados dos computadores e smartphones cada vez mais ocupando os dedos dos jovens, a morte progressiva dos ABCs enfeitados está revelando alguns desafios imprevistos.

Será que as pessoas que escrevem somente em letra de forma – ou talvez com assinaturas desleixadas – correm um maior risco de falsificação? Será que o desenvolvimento de uma habilidade motora mais apurada será prejudicado pela aversão à escrita cursiva? E o que acontecerá quando os jovens que não estão familiarizados com letra cursiva tiverem que ler documentos históricos, como a Constituição dos Estados Unidos?

Jimmy Bryant, diretor do Arquivo e Coleções Especiais na Universidade Central do Arkansas, diz que a ligação com o material de arquivo se perde quando os alunos se afastam da letra cursiva. Durante uma aula no ano passado, Bryant, por capricho, pediu que os alunos levantassem a mão caso conseguissem escrever em letra cursiva como uma forma de se comunicar. Ninguém o fez.

to: The New York Times

Professora Lori Tietz utiliza projetor para analisar escrita cursiva de Megan Porter
Essa sala sem habilidades cursivas incluía Alex Heck, 22 anos, que disse mal se lembrar de como ler ou escrever em letra cursiva. Heck e um primo folhearam o diário de sua avó logo depois que ela morreu, mas mal conseguiram ler a sua escrita cursiva. "Para nós, era algo quase criptografado", disse Heck. Ela e o primo tentaram decifrar a escrita como se fosse um código secreto, lendo passagens inúmeras vezes. "Eu não estou acostumada com a leitura ou a escrita cursiva".

Estudantes de todo o país ainda são ensinados a escrever em letra cursiva, mas muitos distritos escolares estão gastando muito menos tempo ensinando a prática há alguns anos, disse Steve Graham, um professor de educação na Universidade de Vanderbilt. A maioria das escolas começa a ensinar cursiva na terceira série, disse Graham. No passado, a maioria iria continuar o estudo até a quinta ou sexta série – e alguns até a oitava série – mas muitos distritos agora ensinam cursiva apenas na terceira série, em poucas aulas.
"Nas escolas hoje em dia, dizemos que estamos preparando nossas crianças para o século 21", disse Jacqueline DeChiaro, diretora da Escola Elementar Van Schaick, em Cohoes, Nova York, que está debatendo se vai cortar o ensino da cursiva. "Será que a cursiva é realmente uma habilidade necessária no século 21?"

Com as escolas concentradas em preparar os alunos para testes padronizados, muitas vezes não há tempo suficiente para ensinar caligrafia, dizem os educadores. "Se você é uma escola ou um professor, certamente apenas os tópicos nos quais os alunos são testados serão prioritários em seu currículo", disse Graham.
Sandy Schefkind, uma terapeuta ocupacional pediátrica, em Bethesda, Maryland, e coordenadora pediátrica da Associação Americana da Terapia Ocupacional, disse que a aprendizagem da escrita cursiva ajuda os alunos a aprimorar suas habilidades motoras. "É a destreza, a fluidez, a quantidade certa de pressão a se colocar na caneta ou no lápis sobre o papel", disse Schefkind, acrescentando que, para alguns alunos a escrita cursiva é mais fácil de aprender do que a de forma.

Falsificação
Embora a letra de forma possa ser mais legível, quanto menos complexa for a escrita, mais fácil será de forjá-la, disse Heidi Harralson, uma grafóloga de Tucson, Arizona. Apesar da letra poder mudar – e se tornar imprecisa – conforme uma pessoa envelhece, as pessoas que não a aprendem ou praticam estão em desvantagem, disse Harralson. "Estou vendo um aumento na inconstância da caligrafia e na má forma – uma escrita desleixada, semi-legível e inconsistente", disse ela.

A maioria das pessoas tem uma assinatura cursiva, mas mesmo essas estão ficando mais difíceis de identificar, segundo Harralson.
"Mesmo as pessoas que não aprendem cursiva geralmente têm algum tipo de assinatura em forma cursiva, mas ela não é muito bem escrita", disse ela. "Ela tende a ser mais abstrato, ilegível e simplista. Então, se eles optam por usar letras de forma, fica mais fácil de falsificar”.
Sally Bennett, 18 anos, uma caloura da Universidade Central Arkansas, assina seu nome em letras maiúsculas de forma e nunca pensou muito a respeito disso até que teve que fazer o vestibular. Os alunos precisavam copiar um ditado, com instruções explícitas para que não usassem letra de forma. Assim, os vestibulandos tentaram usar a escrita cursiva, disse Bennett. "Algumas pessoas não conseguiam se lembrar de como escrever daquele jeito", disse ela. "Eu tive que pensar um pouco. Foi meio difícil para eu me lembrar”.

Um porta-voz da universidade disse não estar familiarizado sobre a exigência do uso da escrita cursiva. Um porta-voz dos exames SAT (equivalente americano ao Enem) – no qual apenas 15% dos estudantes escreveram a redação em letra cursiva, em 2007 – disse que os alunos também devem copiar um ditado em escrita cursiva. "Os alunos são instruídos a não usar letra de forma", disse a porta-voz Kathleen Steinberg.
Richard Christen, professor de educação da Universidade de Portland, em Oregon, disse que a cursiva pode ser facilmente substituída pela letra de forma ou programas que processam texto em computadores. Masele teme que os alunos perderão uma habilidade artística. "Esses jovens estão perdendo a oportunidade de criar beleza todos os dias", disse Christen. "Mas é difícil para mim oferecer um argumento prático sobre isso. Eu não lamento a situação pela praticidade, eu a lamento pela beleza, a estética".

*Por Katie Zezima
Fonte: Portal iG











quinta-feira, 28 de junho de 2012

Fahrenheit 451 (romance e filme): "Como você se tornou tão vazio?"

Sobre o romance

O romance apresenta um futuro onde todos os livros são proibidos, opiniões próprias são consideradas antissociais e hedonistas, e o pensamento crítico é suprimido. O personagem central, Guy Montag, trabalha como "bombeiro"(o que na história significa "queimador de livro"). O número 451 é a temperatura (em graus Fahrenheit) da queima do papel, equivalente a 233 graus centígrados.

Através dos anos, o romance foi submetido a várias interpretações primeiramente focadas na queima de livros pela supressão de ideias dissidentes. Bradbury, porém,declarou que Fahrenheit 451 não trata de censura, mas de como a televisão destrói o interesse pela leitura.

O autor conta que todo o romance foi escrito nos porões da biblioteca Powell, na Universidade da Califórnia, em uma máquina de escrever alugada. Sua intenção original, ao escrever o romance, era mostrar seu grande amor por livros e bibliotecas, e frequentemente se refere a Montag como uma alusão a ele mesmo.
...
O romance reflete importantes temas inquietantes da época de sua escrita,deixando muitos interpretarem diferentemente do que pretendia Bradbury.Entre os temas atribuídos para o romance, o que Bradbury chamou de "força destruidora de pensamentos" da censura nos anos 50, os incêndios de livros na Alemanha Nazista que começaram em 1933 e as horríveis consequências da explosão de uma armanuclear:

Uma circunstância particularmente irônica é que, sem o conhecimento de RayBradbury, foi publicado uma edição censurada em 1967, omitindo as palavras "droga" e "inferno", para a distribuição em escolas. Edições posteriores (com todas as palavras, sem omissões) incluíram um epílogo do autor descrevendo este evento e outros pensamentos adicionais sobre censura e revisionismo "bem-intencionados".

Censura e os efeitos dos meios de comunicação em massa

O romance é frequentemente interpretado como sendo uma crítica à censura patrocinada pelo estado, mas Bradbury contestou essa interpretação. Ele disse em2007, em uma entrevista, que o livro explora os efeitos da televisão e da mídia em massa na aprendizagem da literatura.

s.[4]
Ainda na versão em brochura, lançada em 1979, Bradburyescreveu uma nova coda para o livro contendo vários comentários sobre a censura e sua relação com o romance. A coda está presente na versão de 1987, que ainda é impressa.

Em outra ocasião, Bradbury observa que a história fala sobre a alienação das pessoas pela mídia:

Em um Estado totalitário em um futuro próximo, os "bombeiros" têm como função principal queimar qualquer tipo de material impresso, pois foi convencionado que literatura era um propagador da infelicidade. Mas Montag (OskarWerner), um bombeiro, começa a questionar tal linha de raciocínio quando vê uma mulher preferir ser queimada com sua vasta biblioteca ao invés de permanecer viva.
Fonte: Wikpédia

Filme
http://youtu.be/mPfbnkbVkD0

Lançamento

1967(1h 52min)

Dirigido por
François Truffaut

Com
Julie Christie, Cyril Cusack

Gênero
Ficçãocientífica, Fantasia

Nacionalidade
França,ReinoUnido

Extraído: AdoroCinema

Artigo sobre a morte de RayBradburyo autor deFahrenheit 451
232,7˚ Celsius

"Fahrenheit 451, atemperatura em que o papel do livro pega fogo e queima", escreveu RayBradbury. Por aqui, seriam 232,7 graus Celsius, fosse preciso queimá-los paraevitar a leitura
Rodolfo Borges

A morte de Ray Bradbury(1920-2012) recuperou em mim um cafona, incômodo e ao mesmo tempo agradável sentimento fraternal em relação aos livros. Fui ler o "Fahrenheit451" pra ver se a coisa passava, e ela piorou. É esse o roteiro que me trouxe, mais uma vez, à patética e ingrata missão autoimposta de tentar convencer os outros a ler.

Você não vai parar derespirar se deixar de abrir um livro. Provavelmente não vai ganhar mais dinheiro se ler com regularidade. Mas – e isso eu posso garantir – você vai se sentir tão bem. Tão livre. Tão forte. Vai expandir seu mundo, perceber que existem outras pessoas, outras formas de viver, outras formas de pensar e,assim, se dar conta de que a agressividade com que trata os outros não faz sentido.

"Como você se tornou tão vazio?", questiona-se Guy Montag, o bombeiro do "Fahrenheit451" que, por profissão, queima livros. Apesar de viver nesse futurístico apocalipse literário, por obra do acaso ele percebe que "é preciso ser incomodado de verdade de vez em quando". Para fora das séries de tevê,para fora da interminável e superficial internet, para dentro de si mesmo.

Apenas metade da população brasileira tentou algo parecido no ano passado, de acordo com a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. A média de quatro livros por ano vai se mantendo há décadas e você ainda se pergunta por que o país segue na mesma, ou pior:acredita que as coisas estão melhorando só porque é possível consumir mais.

O psicanalista francês Pierre Bayard escreveu um livro chamado "Como falar dos livros que não lemos" na tentativa de dessacralizar a literatura e, assim, incentivar a leitura. A obra desempenha bem seu papel (o argumento faz sentido), mas prefiro o reverso da psicologia reversa. Tem um pessoal por aí sentindo, pensando,entendendo, existindo. Quando você começa?
Fonte: Brasil 247




Há mais de um jeito de queimar um livro. E o mundo está cheio de pessoas por aí com caixa de fósforos. Cada minoria, seja Batista, Unitário, Irlândes, Italiano, Octagenário, Zen Budista, Sionista, Adventista, Feminista, Republicano… Acha que tem o direito, ou o dever, de dosar o querosene e acender o fogo. O chefe do corpo de bombeiros Capitão Beatty, em meu romance Fahrenheit 451, descreve como os livros foram queimados primeiramente pelas minorias, rasgando uma página ou duas, depois disso, quando os livros já estiverem vazios e as cabeças fechadas, a livraria fechará para sempre.
…Apenas seis semanas atrás, eu descobri que, através dos anos, alguns editores da Ballantine Books, com medo de "contaminar" os jovens, tinham, pouco a pouco, censurada 75 seções separadas de meu romance. Os estudantes lendo meu livro, me escreveram para me contar essa delicada ironia. Judy-Lynn del Rey, um dos novos editores da Ballantine Books está reeditando o livro inteiro novamente e republicando nesse verão, com todos os "diabos" e "infernos" de volta a seu lugar.


Escrevendo Fahrenheit 451, eu pensei que estava descrevendo um mundo que talvez “aconteceria” em 4 ou 5 décadas. Mas a algumas semanas atrás, numa noite em Beverly Hills, um casal passou por mim caminhando com seu cachorro. Eu fiquei olhando para eles, absolutamente pasmo. A mulher segurava em uma mão um rádio, em forma e tamanho mais ou menos de um pacote de cigarro, com uma antena balançando. Dele saía um minúsculo cabo de cobre que terminava em um delicado fone em forma de cone ligado na sua orelha direita. E ela ia "voando", sonâmbula, esquecida do homem e do cão, escutando à novela que tocava no rádio, guiada por seu marido que provavelmente não estava nem aí. Isso não era ficção.













quarta-feira, 27 de junho de 2012

Pobre classe média

Por Ana Muñoz Álvarez
Periodista

Tradução: ADITAL



Mais de 400.000 famílias vivem graças à pensão dos avós. 22% da população estão em risco de pobreza e, segundo a ONU, a pobreza infantil atinge 26% das crianças. Não estamos falando de um longínquo país asiático ou da pobreza na África. São cifras da Espanha, até agora a quarta economia da zona do Euro.

A crise alterou a agenda e o calendário de muitas famílias. Pessoas que até agora viviam bem, tinham trabalho, casa, seus filhos, sua hipoteca... e que, hoje, têm que buscar ajuda junto a organizações como a Cáritas ou a Cruz Vermelha, para poder dar de comer a seus filhos. Um milhão e setecentas mil famílias espanholas estão com 100% de seus membros em situação de desemprego, e seiscentas mil famílias não dispõem de nenhuma fonte de renda. As organizações da sociedade civil espanhola já vinham alertando sobre a situação que poderia atingir a Espanha. "A crise trouxe à tona as coisas que estavam aí, mas parece que não eram vistas: desigualdades, injustiças...”, explicam membros da Cáritas. Relatórios de antes de 2008, quando a crise estava no começo, falavam que a Espanha não estava reduzindo os índices de pobreza. E essa era época de bonança! Hoje, colhemos o que foi plantado. Se crescia, havia trabalho...; porém, eram empregos precários e de baixa qualificação.

A infância e a terceira idade são os grupos mais vulneráveis em qualquer crise; e também no caso espanhol isso se repete. Segundo a Unicef, mais de dois milhões de crianças vivem em famílias cujo salário não chega ao fim do mês; recortaram sua lista de compras; não podem arcar com os gastos da lista de material escola. Porém, o pior, segundo os especialistas, ainda está por vir; e explicam que a pobreza infantil ainda pode crescer mais. Há uns dois anos, o perfil de pobreza infantil era o de uma crianças de classe baixa, de famílias desestruturadas ou unifamiliares. Atualmente, isso mudou. São crianças de classe média, que viviam bem, tinham de tudo...; porém, seus pais perderam o trabalho e enfrentam uma realidade difícil.

Na Cáritas explicam que muitas crianças que sofrem fracasso escolar passam por isso como um reflexo do fracasso social e familiar em que vivem. No entanto, a partir das organizações ressalta-se que não se trata de um fracasso do indivíduo, mas de um fracasso coletivo, do conjunto da sociedade, que não soube criar as redes suficientes para que as famílias não caiam no vazio.

Para muitas famílias, as pensões dos avós são a única entrada que recebem. Os avós voltam a exercer o papel de pais de família; os pais, o de filhos mais velhos; e os netos passam a ser filhos caçulas. Para os avós, essa é a quarta crise grave que viveram em democracia. São pessoas que trabalharam durante toda a sua vida e, hoje, voltam a ser o suporte da família; pagam as hipotecas dos filhos; ajudam a pagar o carrinho de compras...

A Cruz Vermelha alerta que 23% das famílias não podem comer nenhum tipo de proteína na semana; nem frango e nem embutidos. Muitas famílias não podem ligar a calefação, nem usar água aquecida.

O rosto da pobreza mudou nos últimos anos. Hoje, finalmente, percebemos que qualquer um de nós pode estar sujeito a fazer fila para receber alimentos da "caridade”. O egoísmo, a avareza, o individualismo, um capitalismo levado ao extremo... nos trouxe uma sociedade onde as desigualdades crescem. Estamos colhendo o que vou plantado. Porém, ainda podemos mudar as coisas. Vamos nos unir para que a voz do povo seja escutada, porque queremos outra Europa, outra sociedade, outra maneira de fazer política e de viver. E hoje, mais do que nunca, porque é necessário.

Fonte: ADITAL

terça-feira, 26 de junho de 2012

Guerra não convencional no mundo de hoje


Rafael Correa: “Estamos diante de uma guerra não convencional”


Rafael Correa a Carta Maior, Página/12 e La Jornada: “Estamos diante de uma guerra não convencional”

Em uma entrevista especial concedida à Carta Maior e aos jornais Página/12, da Argentina, e La Jornada, do México, o presidente do Equador, Rafael Correa analisa o que considera ser um dos principais problemas do mundo hoje: o poder das grandes corporações de mídia que agem como um verdadeiro partido político contra governos que não rezam pela sua cartilha. “Essa é a luta, não há luta maior. Estamos diante de uma guerra não convencional, mas guerra, de conspiração, desestabilização e desgaste”.


Rio de Janeiro – Representante de uma nova geração de líderes políticos da esquerda latinoamericana, o presidente do Equador, Rafael Correa, foi lançado para a linha de frente do cenário político mundial com o pedido de asilo político feito, em Londres, pelo fundador do Wikileaks, Julian Assange. Há poucas semanas, Assange entrevistou Correa e os dois conversaram, entre coisas, sobre um tema de interesse de ambos: as operações de manipulação conduzidas pelas grandes corporações midiáticas. Agora, durante sua passagem pela Rio+20, Rafael Correa voltou com força ao tema.

Em uma entrevista especial concedida à Carta Maior e aos jornais Página/12, da Argentina, e La Jornada, do México, analisa este que considera ser um dos principais problemas do mundo hoje: o poder das grandes corporações de mídia que, na América Latina, agem como um verdadeiro partido político contra governos que não rezam pela cartilha desses grupos. “Essa é a luta, não há luta maior. Estamos diante de uma guerra não convencional, mas guerra, de conspiração, desestabilização e desgaste”.

Na entrevista, Correa fala sobre o pedido de asilo de Assange, relata o debate sobre uma nova lei de comunicações no Equador e faz um balanço pessimista sobre os resultados da Rio+20.

Há um argumento segundo o qual a liberdade de imprensa é propriedade dos meios de comunicação empresariais. Imagino que essa não seja a sua opinião.

Correa: Não nos enganemos. Desde que se inventou a impressora a liberdade de imprensa, entre aspas, responde à vontade, ao capricho e à má fé do dono da impressora. Devemos lutar para inaugurar a verdadeira liberdade de imprensa que é parte de um conceito maior e um direito de todos os cidadãos, que é a liberdade de expressão, que defendemos radicalmente. No entanto, o poder midiático que faz negócios com o objetivo de ter lucro, até isso quer privatizar. Então, se eles têm tanta vocação para comunicar, como dizem, que o façam sem finalidades lucrativas, porque para mim isso é uma contradição.

Este é um grande problema na América Latina e também em nível planetário. Tenho tomado conhecimento que existem posições semelhantes às nossas, mas houve um tempo em que nos sentíamos muito sozinhos, quando fomos vítimas de um ataque tremendo por não abaixar a cabeça diante de um negócio muitas vezes corrupto e encoberto sob a capa da liberdade de expressão. Essa é a luta, não há luta maior.

Presidente, nestes dias foram divulgados telegramas pelo Wikileaks onde apareceram jornalistas equatorianos que eram considerados informantes pela embaixada dos Estados Unidos. Isso confirma as hipóteses levantadas quando você foi vítima de um golpe de Estado.

Correa: As mentiras deles sempre acabam sendo derrubadas. Entidades que financiam esses empórios midiáticos, certas organizações que, em nome da sociedade civil, nos denunciam ante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a SIP, ante todos os lados. Agora vemos que esses senhores são identificados via Wikileaks como informantes da embaixada (estadunidense). Wikileaks que nunca é publicado pela maioria da imprensa comercial. Não é só isso. Essa gente é financiada pela USAID, que vocês conhecem. A USAID financiou com 4,5 milhões de dólares a estes supostos defensores da liberdade de expressão, supostamente para fortalecer a democracia e a ação cívica. Na verdade, para fortalecer a oposição aos governos progressistas da América Latina e os povos da região tem que reagir contra esse tipo de prática.

Independentemente da solicitação do senhor Assange – ele solicitou asilo político -, ele disse que quer vir para o Equador para seguir cumprindo sua missão em defesa da liberdade de expressão sem limites, porque o Equador é um território de paz comprometido com a justiça e a verdade. Isso que o senhor Assange disse é mais próximo da realidade do Equador do que as porcarias que o poder midiático publica todos os dias.

Sabemos que o senhor ainda não tomou uma decisão sobre a situação que está atravessando alguém que revelou informações secretas sobre conspirações dos Estados Unidos e está pagando com a prisão por ter trabalhado pela liberdade de imprensa.

Correa: Se, no Equador, alguém tivesse passado a centésima parte do que passou Assange, nós seríamos chamados de ditadores e repressores, mas como o que Assange divulgou afeta as grandes potências e isso evidencia uma moral dupla e como os Estados nos tratam por meio de suas embaixadas, então é preciso aplicar todo o peso da lei contra Assange. E o chamam de violador.

Eu não quero antecipar minha decisão. Recebemos o pedido de asilo, analisaremos as causas desse pedido e tomaremos uma decisão quando for pertinente. Ele está em nossa em nossa embaixada em Londres sob a proteção do Estado equatoriano.

É claro que há aqui uma dupla moral, uma para os poderosos e outra para os débeis, uma para os que querem manter o status quo e para sua imprensa, e outra para os governos que querem mudar esse status quo e para a imprensa alternativa. Todos os dias há julgamentos em países desenvolvidos contra jornais. Neste caso não há problema, porque isso é civilização, mas, processar em nosso país um jornal ou um jornalista é qualificado como barbárie. E não é verdade que nós criminalizamos a opinião, pois em nosso país todos os dias publicam tudo, todos os dias publicam que há falta de liberdade de expressão. Qualquer um pode dizer que o governo é bom ou mau, que é competente ou incompetente. Mas o que não pode se dizer em um meio de comunicação é que o presidente, ou qualquer cidadão, é um criminoso de lesa humanidade e que ele disparou sem aviso prévio contra um hospital, porque isso é difamação, isso é delito em qualquer país.

O caso Assange pode dar origem a uma tensão diplomática entre Equador e Grã-Bretanha?

Correa: Isso é a última coisa que queremos, mas nós não vamos pedir permissão a nenhum país para tomar decisões soberanas. O Equador não tem mais alma de colônia nem alma de vassalo. Se dar asilo, refúgio ou residência a fugitivos da justiça provocasse deterioração, a relação da América Latina com os Estados Unidos estaria deterioradíssima. Porque, provavelmente, Argentina, Brasil, México e outros países não devem estar de acordo que qualquer fugitivo que viole a justiça. Esse não é o caso do senhor Assange, mas sim de corruptos como os banqueiros que quebraram o Equador em 99 e fugiram para os Estados Unidos, onde gozam hoje de uma vida bastante cômoda.

Vocês têm um Murdoch no Equador?

Correa: No Equador, temos seis famílias que representam heranças familiares, não é propriedade democrática, um capitalismo popular onde há 10 mil acionistas em um empório. Os meios de comunicação no Equador são manejados por meia dúzia de famílias, que decidem o que os equatorianos devem saber e conhecer. Vocês se dão conta da vulnerabilidade que temos como sociedade? A informação depende dos interesses e dos caprichos de meia dúzia de famílias. Mas se um governo soberano e digno não as chama para consultar sobre o nome dos ministros ou sobre a indicação de embaixadores, como ocorria antes, vão com tudo para cima desse governo porque ele não se submete aos seus caprichos. É um problema mundial, mas em outros países é atenuado com participação, profissionalismo muito profundo, uma ética muito forte, tudo o que brilha por sua ausência aqui no Equador.

Presidente, um funcionário da Usaid acaba de dizer que eles estão ajudando as oposições a estes governos.

Correa: Franqueza anglo-saxã.

Impunidade?

Correa: Impunidade e arrogância.

Essa ideia nos fala de um tempo da informação como arma de guerra e a América Latina sofre uma verdadeira invasão dessas fundações como a USAID, a NED, o IRI. Isso não torna muito perigosa a nossa situação? A presença das ONGs destas fundações não é perigosa para o Equador?

Correa: Oxalá consigamos despertar os povos latino-americanos para essa situação. As direitas, os grupos de poder, sabem que nas urnas não conseguirão nos derrotar. Daí as campanhas contínuas de desgastes, de propaganda, de difamação, de enfraquecimento e desestabilização. Nós vivemos isso desde os primeiros dias de governo. Desde o primeiro dia de governo. O mesmo ocorre na Venezuela, na Bolívia, na Argentina e em todos os governos progressistas da região. Sofremos as campanhas desses meios que são a vanguarda do capitalismo, do status quo dos partidos tradicionais de direita que se afundaram por seus próprios erros, para difamar, para distorcer a verdade com a cumplicidade de veículos da mídia internacional.

Essa é a contradição de que fala Ignacio Ramonet. Na Europa hoje há desemprego, estagnação, resgate de milionários, resgate de bancos e não de cidadãos, e os jornais dizem que isso é necessário, que é sério, técnico e correto. Que as pessoas morram de fome, precisamos salvar o capital! Enquanto isso, em países como o Equador, que é um dos que mais crescem na América Latina, que reduziu a pobreza, gerou mais emprego, tem a taxa de desemprego mais baixa da região e da história, todos os dias nos dizem que isso é populismo e demagogia, que é preciso mudar de governo.

Estamos ante uma campanha propagandística para defender os poderes fáticos que sempre dominaram nossos países. A direita perdeu as eleições nos Estados Unidos e agora chegam essas organizações para financiar esses grupos na América Latina. Estamos diante de uma guerra não convencional, mas guerra, de conspiração, desestabilização e desgaste.

Por isso pergunto sobre o tema da informação como arma de guerra, como a arma letal antes do primeiro disparo.

Correa: Estou convencido disso. Alguns ainda imaginam a imprensa, sobretudo na América Latina, como o quarto poder nascente, que floresceu quando chegaram as democracias, quando ocorreram avanços técnicos e se multiplicaram as publicações, quando se avançou na alfabetização e as grandes massas passaram a poder ler. Esse poder impediria que o poder político, o poder do Estado, ultrapasse certos limites. Assim chegou a desinformação. Lembremos, por exemplo, do affair Dreyfus na França, quando por racismo e xenofobia se acusou um capitão judeu, como denunciou Emile Zola em seu famoso editorial “Eu acuso”. Essa imprensa limitava os excessos do poder político, mas esse vigoroso e ingênuo cachorrinho, bem intencionado, que lutava pelos interesses dos cidadãos, converteu-se de repente em um mastim feroz, com um poder ilimitado, raivoso, que não só tenta encurralar o Estado como também os próprios cidadãos.

O poder midiático na América Latina, como ocorre no Equador, é frequentemente superior ao poder político. Precisamos tirar certos estereótipos de cena ou do ambiente de certa burocracia internacional como alma de ONG, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos que fala de pobrezinhos jornalistas e de malvados políticos. Isso não é certo. Os políticos são, muitas vezes, patrióticos. A antipatia que certos jornalistas alimentam, desfiando seus ódios e amarguras, acaba fazendo com que se metam inclusive em questões pessoais, com a família, etc. Então, vejamos a realidade. Trata-se de tabus e nos ensinaram a ter medo de criticar esses negócios, como se, criticando-os, estaríamos criticando a liberdade de expressão. Esses são os negócios da má imprensa.

Presidente, viremos a página e passemos à crise

Correa – É que esse tema (da mídia) me apaixona. É um tema acadêmico que me apaixona, ao qual dedicarei meu tempo quando sair da presidência. Pretendo me dedicar a ele, investigar e escrever porque se trata de um problema gravíssimo, porque estamos nas mãos de um poder midiático que superou inclusive o poder financeiro e político, e domina o mundo.

Você resumiu ontem em uma palavra o documento final da Rio+20, classificando-o como “lírico”…

Correa – É assim. Não há compromisso concreto. Podem verificar. Onde há um compromisso em cifras, por exemplo, com o limite de emissões de gases, compensações, acordos, acordos vinculantes como seria uma declaração de direitos da natureza em um tribunal internacional do meio ambiente, como propôs o Equador. Não há nada disso. Fala-se de cuidar melhor do planeta, mas não há um compromisso concreto. O avanço é muito pequeno.

A que atribui a ausência dos Estados Unidos e da Alemanha? Elas podem ter contribuído para essa falta de compromissos concretos?

Correa – Vai mais além. O problema não é técnico. Todo mundo sabe qual é o problema, todo o mundo sabe quais são as respostas. O problema é político. Quem gera os bens ambientais e quem consome esses bens ambientais? Se os países ricos ou os países em desenvolvimento podem consumir gratuitamente um bem que outros geram por que é que vão se comprometer a compensar e cuidar. Não farão isso a não ser que esteja em perigo evidente sua própria existência ou seus próprios interesses.

Então, o problema é político, é a relação de poder. Imagine que a situação fosse a inversa, que a Floresta Amazônica, por exemplo, estivesse nos Estados Unidos e que eles fossem geradores de bens ambientais e que nós dos países em desenvolvimento fôssemos os consumidores. Já teriam nos invadido em nome dos direitos humanos, da justiça, da liberdade, etc., para exigir compensações. Então, esse é um problema de poder. Enquanto não mudarem as relações de poder, muito pouco se irá avançar.

Considera então que o saldo provisório da Rio+20 é um fracasso?

Correa – Sim. Não se conseguiu avançar quase nada. Não há compromisso concreto, nada concreto. Nem sequer dinheiro. Houve uma reunião do G-20 no México e a maioria, 80% dos que estavam lá, regressaram para suas casas. Não vieram para a Rio+20. Não interessa. Apenas alguns poucos vieram para a Cúpula, sobretudo latino-americanos.

Houve também a Cúpula dos Povos, um encontro muito interessante.

Correa – Quisemos participar, mas não foi possível, estava muito longe. Infelizmente foi um problema de logística. Mas vamos ter um evento de direitos da natureza, paralelo à Cúpula, nos mesmos locais da Cúpula, para o qual convidamos 400 dirigentes de organizações sociais alternativas, progressistas de esquerda que buscam a justiça de nossa América e do mundo inteiro. O presidente Evo Morales também participará dessa conferência.

Eu queria perguntar-lhe sobre o que representam estas alianças como a do Pacífico (Colômbia, Chile, Peru e México) e o anúncio feito pelo presidente Felipe Calderón do Transpacífico, que é algo novo. Isso pode ser visto como uma ameaça à integração e à unidade da América Latina?

Correa – Bom, o maior problema em essência sobre o tema do cuidado com o meio ambiente e que também está na base da crise da Europa e dos Estados Unidos é que tudo foi mercantilizado. Eles não querem ver isso porque afeta os interesses dominantes. O mercado é uma realidade econômica que não podemos negar, mas o grande desafio da humanidade é que a sociedade deve conseguir dominar o mercado. O que temos hoje é o mercado dominando a sociedade e as pessoas, mercantilizando tudo. Como o mercado só se interessa pelo que é mercadoria, pelo que tem preços explícitos, não administra adequadamente bens públicos como o meio ambiente. Por isso pode consumir irresponsavelmente bens ambientais, bens públicos globais, depredar a natureza, etc., porque não têm preços explícitos, porque não são mercadoria.

Então, quanto mais se ampliar essa lógica do mercado, mais esses problemas se agravarão e os perigos serão ainda maiores para a conservação do planeta. Eu diria que nós somos muito críticos destes tratados de livre comércio, somos muito críticos da mercantilização da vida e da humanidade em geral. Esse é um dos grandes desafios que enfrentamos. Insisto, o mercado é um fenômeno econômico irrefutável, mas o grande desafio é fazer com que as sociedades dominem o mercado e não o contrário.

Senhor presidente, que medidas os países da América Latina deveriam tomar para não perder o rumo da histórica na direção de uma integração regional soberana e progressista. Como vê os avanços no Mercosul, na Unasul e na Comunidade Andina de Nações (CAN)?

Correa – Avançou-se como nunca antes. Isso não quer dizer que estejamos bem. Teremos que avançar muito mais rápido. Creio que há uma vocação concreta e uma posição integracionista sincera, não uma integração mercantilista como havia antes. O Mercosul nasceu na noite neoliberal dos anos 90. A CAN nasceu a todo vapor e depois diminuiu. A integração mercantilista não quer fazer grandes sociedades de nações, mas sim grandes mercados, não fazer cidadãos de nossa América, mas sim consumidores. A concepção da Unasul é diferente. Nós temos uma concepção integral, onde uma parte é comercial, que sempre é importante, mas não é o mais importante, e as outras partes tem a ver com conectividade, nova arquitetura financeira regional, harmonização de políticas, políticas de defesa. Oxalá consigamos avançar também em políticas trabalhistas para que nunca mais caiamos na América Latina na armadilha de competir para atrair investimentos, deteriorando e precarizando as forças de trabalho. Ao invés de atrair capitais na base do suor e das lágrimas de nossos trabalhadores, pensamos em outro mundo. Como disse, creio que avançamos, mas precisamos ir muito mais rápido.

O senhor tocou de passagem o tema do Conselho de Defesa Sulamericano, que está objetivamente estancado, e seu país sofreu um ataque estrangeiro em 2008. Na sua avaliação, com a chegada do presidente Santos na Colômbia, a hipótese de tensões entre Colômbia e Equador está completamente dissipada?

Correa - As relações bilaterais entre Equador e Colômbia gozam de um extraordinário momento. Há uma grande coordenação com o governo do presidente Santos. A Colômbia sempre foi o vizinho com o qual tivemos a melhor relação em nossa história. Infelizmente, essa história, séculos de irmandade, foi rompida pela traição de um presidente como Uribe. Mas, graças a deus, com o governo do presidente Santos isso foi superado e creio que ele também tem uma vocação integracionista muito profunda e apoia – de fato, tem apoiado – a proposta do Conselho de Defesa.

O Conselho de Defesa teve seus primeiros estremecimentos com o anúncio da radicação de tropas dos Estados Unidos na Colômbia. Essa possível radicação de tropas norte-americanas na Colômbia está definitivamente abortada?

Correa – Não tenho maiores conhecimentos a respeito desse assunto. Até onde sei há uma estreita colaboração norteamericana com o pretexto da luta antidrogas e oxalá que a ajuda se concentre aí. Mas temos que fazer um esforço de bastante ingenuidade para nos convencermos disso porque muitas vezes se fazem outras coisas com essas supostas ajudas, sobretudo com governos que não sigam a linha de Washington.

A pergunta anterior está associada a outras situações graves como a remilitarização com novas bases no Panamá e outros três centros operacionais do comando Sul , uma base nova no Chile e nas Malvinas o grande problema é a base britânica ali instalada. Toda esta expansão dos Estados Unidos não é ameaçadora para a região?

Correa – Nós queremos nos convencer que com Barack Obama, que acreditamos ser uma boa pessoa, a política internacional dos EUA mudou, mas as evidências nos mostram que não é assim, que tudo continua lamentavelmente igual, sobretudo no que diz respeito à América Latina, cujos governos comprometidos com justiça, dignidade e soberania passaram a ser vistos como uma ameaça para seus interesses. Devemos estar muito atentos a essa presença das forças armadas norte-americanas em nossa América e a esse processo de rearmamentismo que está ocorrendo nesta época tão difícil e complexa.

Fonte: Vi o Mundo

domingo, 24 de junho de 2012

Mamma Roma (Pasolini)

O filme marca a trajetória de Mamma Roma (Anna Magnani), uma ex-prostituta que vai atrás do filho abandonado por ela, Ettore (Ettore Garofalo), e que tenta uma vida nova junto com ele na capital italiana. Interpretada magnificamente pela atriz Anna Magnani, a personagem se vê em várias dificuldades sociais como a criminalidade que seu filho se envolve e a sua exploração pelo cafetão Carmini (Franco Citti).

Mamma Roma sonha com uma vida burguesa, mas suas esperanças se confrontam com a realidade. Ela vive em um contexto social que impossibilita a realização de seus sonhos. A vida se mostra mais dura e cheia de desencantos do que ela pode imaginar. Em seu segundo filme, o cineasta italiano Pier Paolo Pasolini faz poesia com cinema em ""Mamma Roma"". Num filme belo, porém ainda marcado pelo neo-realismo que fez escola durante as décadas de 1940 e 1950, o polêmico diretor italiano consegue pôr seu dedo malicioso e cheio de lirismo nessa película produzida em 1962.

Numa retomada dos procedimentos neo-realistas do pós-guerra, Pasolini volta sua câmera para os bairros pobres da periferia de Roma e filma a vida errante dos personagens ao som de Schubert. O filme se mostra belo e mesmo com uma clara influencia ""rosseliniana"". Só Pasolini conseguiria filmar ""Mamma Roma"" com tanto sentimentalismo sem tirar a critica social da base da história.


Ficha Técnica: "Mamma Roma", Idem, 1962 - 110 mim, preto & branco. De Pier Paolo Pasolini, com Anna Magnani, Franco Citti, Ettore Garofolo, Silvana Corsini, Luisa Loiano e Paolo Volponi

Fonte: SESC CineClube Silenzio


http://youtu.be/3ZhIitjiBLc


Curiosidades

Este filme é um grande objeto de estudo para muitos pesquisadores do cinema, pelo fato de que seus planos e ângulações são fortemente inspirados em afrescos de Giotto, Caravaggio e outros grandes artistas plásticos.

Nos estudos, os pesquisadores abordam a influência das artes plásticas no cinema e na constituição de sua linguagem

Fonte: Wikipédia

sábado, 23 de junho de 2012

A pseudomorfose


Pe. Antonio Vieira, um desses personagens que ninguém encaixa numa categoria só

Braulio Tavares*

O jornal literário Rascunho, de Curitiba, publicou em abril uma entrevista de Alfredo Bosi, Ler com a alma (http://bit.ly/ IKEary). Ele examina a figura do Pe. Antonio Vieira (1608-1697), um desses personagens que ninguém encaixa numa categoria só. Vieira, na sua ação política e na expressão ideológica, era um sujeito escorregadio, elusivo, que mordia e assoprava todo mundo no arriscado xadrez político do seu tempo. Se me perdoam a comparação plebeia, ele vivia dando o drible-da-vaca nas autoridades, tocando a bola para a direita e rodeando-as pela esquerda, com um volteio da frase. Vieira foi um dos fundadores do nosso idioma, e fez pela prosa o que Camões fez pela poesia. Ler Vieira é como fazer um passeio de asa-delta com um instrutor experiente. A gente nunca pensaria aquilo sozinho, mas tendo a voz dele como guia fica com a sensação de ser capaz de pensar qualquer coisa.

A certa altura, Bosi comenta as análises de Otto Maria Carpeaux sobre Vieira, e diz: “Vieira queria que todos pagassem impostos, inclusive o terceiro Estado, e não tivessem os privilégios a nobreza e do clero; ele diz coisas muito fortes contra a desigualdade das contribuições. Finalmente, ele diz que o que vale no homem é o que ele faz, e não os seus ascendentes, sua linhagem. Parece uma idéia que só na Revolução Francesa vai ter seu momento tremendo, sua explosão. A idéia de que somos iguais, filhos do mesmo Adão, e pela teologia não deve haver nobres, não deve haver hierarquias. Então ele diz, num dos sermões, somos o que fazemos, não somos o nosso nome, mas a nossa ação. (...) Carpeaux chama isso de pseudomorfose. É como uma pessoa que tem forma muito conservadora, mas idéias revolucionárias, ou então uma pessoa que tem palavras muito revolucionárias na boca, mas ela tem toda uma ação conservadora. Isso é muito comum na nossa época, como é que uma pessoa tem uma forma que não convém ao seu conteúdo? E isso é a pseudomorfose”.

Maiakóvski, por exemplo, dizia que não pode haver idéia revolucionária sem forma revolucionária, e que as grandes transformações sociais exigem grandes transformações da linguagem poética. Mas talvez ele dissesse isto porque nele convergiram a Revolução Soviética (um dos maiores catalisadores de utopias do século 20) e o Formalismo Russo, um complexo movimento de vanguarda. Vieira não foi vanguarda literária no sentido de ruptura, como Maiakóvski, mas foi o ponto mais alto de uma tradição, o que no frigir dos ovos vale muito bem uma vanguarda. Sua linguagem e sua postura escorregadia foram instrumentos para colocar em xeque a própria cultura e civilização que produziram aquela linguagem.

*Braulio Tavares é escritor, poeta e compositor brasileiro. Seus textos são publicados em sua coluna diária no Jornal da Paraíba (Campina Grande-PB).

Fonte: Brasil De Fato

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Intelectual francês vira chefão do varejo brasileiro

O intelectual executivo

Jean-Charles Naouri assume na sexta o posto de Abilio Diniz no comando do Pão de Açúcar

Jean-Charles Naouri, controlador do Casino

Um intelectual francês que chegou ao varejo relativamente tarde em sua carreira deve se tornar o novo chefão da indústria no Brasil, um dos maiores e de mais rápido crescimento mercados do mundo.

Na sexta-feira, Jean-Charles Naouri, o presidente do grupo francês Casino, vai assumir o controle da maior rede de varejo do Brasil, o grupo Pão de Açúcar, no auge de uma estratégia para criar uma gigante do setor em mercados emergentes.

Para o executivo de 63 anos, a chegada ao comando do Pão de Açúcar virá com um gosto de revanche sobre o parceiro Abílio Diniz, atual presidente do conselho do grupo brasileiro que no ano passado tentou romper um acordo com o Casino ao propor uma fusão da companhia brasileira com o arquirrival do grupo francês, o Carrefour.

A vitória de Naouri na ferrenha disputa que se seguiu é emblemática sobre a forma como ele construiu um império de varejo que fatura 34 bilhões de euros (R$ 87,51 bilhões) por ano e que se espalha por 10 territórios. O executivo assumiu participações minoritárias em companhias com problemas e então passou a aumentar a influência do Casino quando a recuperação estava garantida.

"Ele não inicia disputas. Elas surgem porque os empresários não aceitam vender suas companhias quando chega a hora", disse o estrategista de negócios Alain Minc, que assessora Naouri.

Em 22 de junho, Naouri, nascido na Argélia, vai se tornar presidente do conselho da holding controladora do grupo Pão de Açúcar conforme descrito em um acordo acertado em 2005 com Diniz. Apesar do empresário brasileiro reter o título de presidente do conselho do Pão de Açúcar, seu peso na tomada de decisões será bastante reduzido.

O Casino investiu pela primeira vez no Pão de Açúcar em 1999, quando resgatou o grupo de dificuldades. Atualmente o Brasil é o segundo maior mercado para o Casino no mundo depois da França e é um pilar importante na expansão do grupo francês em mercados emergentes em um momento de fraqueza na Europa.

Depois que o Casino assumir o controle, o Brasil vai representar 44% das vendas estimadas do grupo, de quase 54 bilhões de euros (R$ 138 bilhões), e 53% do lucro operacional estimado em 2,6 bilhões (R$ 6,7 bilhões) para 2013, segundo analistas da Oddo Securities.

Origem

Filho de um médico e de uma professora de inglês, Naouri se graduou na Ecole Normale Superieure e na Ecole Normale d'Administration (ENA), berços das elites política e de negócios da França.

Ele iniciou sua carreira em ministérios do governo francês, incluindo o de Finanças, onde ele foi chefe de equipe do ministro socialista Pierre Beregovoy, na década de 1980, antes de ir para o setor privado e ingressar no Banque Rothschild em 1987.

"Ele é quatro vezes mais rápido que as pessoas mais espertas que eu conheço", disse Serge Weinberg, diretor da Weinberg Capital Partners e seu amigo desde os anos na ENA.

Pessoas próximas de Naouri o descrevem como um perfeccionista e como um homem complexo e reservado, que não se mistura muito nos círculos de negócios da elite francesa.

"Ele é muito intenso, um erudita que é interessado em questões fundamentais", acrescentou Weinberg. Um fã de ópera que grego e latim, Naouri montou seu próprio fundo Euris em 1987.

Ele migrou para o varejo por meio do Rallye, um grupo de investimento que hoje controla 49,9% do capital do Casino.

Em poucos anos Naouri enfrentou sua primeira batalha, ajudando o Casino a se defender em 1997 de uma oferta do grupo francês Promodes, que mais tarde foi adquirido pelo Carrefour.

Desde que se tornou presidente-executivo do Casino em 2005, Naouri é considerado como responsável pela recuperação do grupo, eliminando operações deficitárias e abrindo unidades em mercados de rápido crescimento como Brasil, Vietnã, Colômbia e Tailândia.

Naouri é descrito como um chefe exigente que pode ser duro com a equipe. "Se ele recebe uma resposta vaga, você pode perder o emprego muito rapidamente", disse um ex-funcionário do Casino pedindo para não ser identificado.

O executivo é pai de três filhos, o mais velho, Gabriel, 30, dirige os hipermercados do grupo na região de Paris.

Com as relações azedadas entre Naouri e Diniz, os grupos têm discutido alternativas ao acordo de acionistas que possam permitir que sigam caminhos diferentes. Mas um acordo tem sido difícil.

No mês passado, Naouri acertou os ponteiros com os que ele julga o terem traído. Ele afastou tanto Diniz quanto Philippe Houze, presidente da varejista Galeries Lafayette, do conselho do Casino.

Por Dominique Vidalon e Pascale Denis

Fonte: Portal iG

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Mais recursos para a educação: nada a perder e muito a ganhar


*Otaviano Helene

 Atrasos escolares como os nossos, na forma de um pequeno índice de atendimento na educação infantil, grande quantidade de analfabetos e de adultos com poucos anos de estudo, evasão escolar muito alta ao longo do ensino básico e falta de profissionais qualificados, comprometem gravemente e de forma definitiva o futuro de um país. Para superar essa situação, precisamos elevar os investimentos diretos em educação pública. Mas será que aumentar esses investimentos pode comprometer outras atividades do país, em particular, as atividades econômicas?

A resposta é não, por várias razões. Uma delas é que os investimentos em educação têm altas taxas de retorno, ou seja, se pagam em pouco tempo. Portanto, aumentar esses investimentos não apenas não compromete a economia como, ao contrário, contribui para dinamizá-la. Outra razão é que, apesar das nossas limitações econômicas, há margens para aumentar os investimentos, em especial em um período de crescimento da produção acima do crescimento populacional, como tem ocorrido nos últimos anos. Vamos ver essa segunda razão.

O financiamento público da educação em outros países

...o Brasil ocupa uma posição intermediária, a qual não seria confortável nem mesmo para um país sem grandes contingentes de crianças e jovens e sem atrasos como os nossos. Se continuarmos nessa posição, continuaremos mantendo nossa atual situação educacional: precária e insuficiente até mesmo para garantir as condições necessárias para uma real e permanente soberania nacional.
Embora haja algumas poucas exceções, os países que apresentam bons indicadores educacionais, ou que os têm melhorado significativamente, estão no grupo daqueles que fazem investimentos mais altos em educação. Também estão nesse grupo aqueles países que apresentam condições sociais melhores do que outros com as mesmas possibilidades econômicas. Cuba, Dinamarca e Suécia são os três que mais esforços investiram em educação naquele período. No conjunto com menores taxas de investimento em educação estão aqueles países que apresentam as piores situações, não apenas educacionais como sociais em geral: Camboja, Emirados Árabes Unidos (2) e República Dominicana são, entre aqueles cujos dados estão representados na figura, os três que menos investiram.
 
Se ficarmos onde estamos, não iremos superar as barreiras que impedem o aumento da produção econômica, nem promover o desenvolvimento social, enfrentar as desigualdades de renda e recuperar, ainda que em parte, nossos atrasos. Se nos deslocarmos na direção à direita do gráfico, iremos nos aproximar de países totalmente dependentes e/ou que apresentam indicadores sociais terríveis. Não podem restar dúvidas da direção que devemos nos deslocar naquele gráfico.

Existem fontes de recursos

Há muitas possíveis fontes para viabilizar o aumento dos recursos destinados à educação pública.

Comparando a arrecadação de impostos sobre propriedade no Brasil com a realidade tributária em outros países capitalistas, inclusive tributos sobre grandes fortunas (3), o IPEA (4) aponta a possibilidade de um aumento dos recursos públicos em até 2,7%. Como aqueles países capitalistas não iriam tomar decisões que pudessem prejudicar suas economias, a pergunta óbvia é: por que não fazemos o mesmo?

O mesmo documento do IPEA aponta que a não supressão de impostos e a redução das renúncias e dos subsídios poderiam gerar outros 3,7% do PIB. Além dessas possibilidades, cada 1% de redução na taxa básica de juros geraria mais 0,6% do PIB em recursos públicos para a União, os estados e os municípios.

Correções de alíquotas dos diversos impostos ou o enfrentamento da sonegação poderiam aumentar ainda mais as possibilidades de financiamento do setor público, colocando-nos em uma situação mais próxima daquela ocupada pelos países mais organizados. E todas essas correções não apenas não afetariam negativamente a economia do país como, ao contrário, poderiam ter impactos sociais muito positivos.

Mais e melhor educação cabem no PIB

Outra maneira de verificar que é possível o aumento dos recursos para a educação pública é analisar a evolução recente da economia nacional. Ao longo dos últimos oito anos, o PIB brasileiro cresceu perto de 25% acima do crescimento populacional, ou seja, o crescimento foi suficiente para absorver o aumento da população e, além disso, aumentar da quarta parte o valor econômico da produção por pessoa. Se uma fração desse aumento da produção fosse destinada à educação, poderíamos atingir investimentos significativamente mais altos do que os atuais sem afetar negativamente outras atividades nacionais. Ao contrário, dependendo da forma que o aumento da produção per capita for transferido para a educação e outras áreas de interesse social, pode haver ganho nos dois lados: melhoram-se os níveis educacionais da população ao mesmo tempo em que se inibe um consumismo doentio e destrutivo.

É necessário lembrar que, ao se transferir parte do aumento da produção econômica para a educação, não se a estaria reduzindo ou se desfazendo dela: a indústria da construção civil seria aquecida mais intensamente na forma de reformas e construções de equipamentos escolares; o número de empregos formais também cresceria, com maior concentração na forma de trabalhadores em educação; a renda pessoal também cresceria, mas na forma de melhores remunerações para professores; haveria aumento da produção de veículos para atender à demanda gerada pelo setor educacional, incluindo aí seus trabalhadores. Da mesma forma, o aumento do consumo de eletricidade ou de equipamentos elétricos, eletrônicos e de informática também ocorreria, mas mais concentradamente pelos trabalhadores da educação e pelas instituições educacionais.

Enfim, tendo em vista a realidade de outros países, considerando as possibilidades de transferências de recursos para o setor público e, ainda, a realidade da produção econômica, vemos que é totalmente viável aumentar os investimentos em educação pública, bem como em outros setores de interesse social. O que nos impede de fazer isso? Será por ignorância, ou há um propósito pouco nobre por trás de tais decisões?

Notas:
1) Unesco Institute for Statistics. Sítio consultado em abril/2012.

2) Os Emirados Árabes Unidos, apesar de terem uma renda per capita mais do que quatro vezes superior à brasileira, da ordem de 48.000 dólares pelo critério da paridade de poder de compra, têm taxas de analfabetismo quase exatamente iguais às nossas, apresentando talvez o maior desencontro entre as possibilidades econômicas e o padrão educacional.

3) Nos EUA, as grandes fortunas são taxadas no processo de herança. Quando John D. Rockefeller morreu, em 1937, 70% do patrimônio foi recolhido na forma de imposto sobre bens herdados (New York Times, 8/6/2010, Legacy for One Billionaire: Death, but No Taxes). Após algumas décadas de recuo, a alíquota máxima do imposto sobre grandes heranças naquele país foi reduzida a 35%, devendo subir para 55% em 2013. Veja, p. ex., o verbete Estatetax in the United States da Wikipedia.

4) Financiamento da Educação: necessidades e possibilidades, Comunicados IPEA no 124, dezembro/2011, acessível por internet.

Fonte: Correio da Cidadania

*Otaviano Helene, professor no Instituto de Física da USP, foi presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).