*Paula Miraglia
Uma comissão de juristas do Senado vem analisando possíveis revisões no Código Penal brasileiro. Um dos objetivos da reforma é fazer com que a legislação seja capaz de dar conta de novas condutas criminosas advindas dos contextos sociais atuais.
Na semana passada, a comissão aprovou, entre outras coisas, a criminalização da homofobia. A mesma proposta também ampliou o número e natureza de situações que poderão ser tipificadas como preconceito, como preconceito contra mulheres e preconceito de origem. Se aprovados, tais crimes serão igualados ao crime de racismo, que hoje é imprescritível e inafiançável.
O texto ainda será encaminhado para votação no Congresso, mas desde já vale refletir sobre seu significado e possíveis implicações.
A proibição a qualquer tipo de preconceito está prevista na Constituição de 1988. No entanto, não há um detalhamento maior sobre grupos ou situações especificas. Esse caráter genérico do texto constitucional parece não ter sido suficiente para evitar a perpetuação de comportamentos discriminatórios no cotidiano.
No caso da homofobia em particular, além da discriminação em si, o que temos assistido é o aumento sensível dos casos de violência, num gradiente que inclui desde agressões verbais até assassinatos. Segundo um levantamento realizado por organizações da sociedade civil, o Brasil está entre os campeões da violência homofóbica e o número de homicídios que tem esse tipo de preconceito como motivação vem crescendo nos últimos anos.
A criminalização de condutas sozinha nunca foi suficiente para prevenir a violência ou reduzir índices de criminalidade, e ainda pode ter efeitos colaterais indesejáveis. A lei de crimes hediondos e a consequente superlotação dos presídios no Brasil talvez sejam a maior prova nesse sentido.
Assim, fazer da homofobia um crime não será suficiente para garantir que cidadãos brasileiros não sejam vítimas de preconceito, discriminação e, consequentemente, violência. A transformação real passa por uma polícia mais preparada, um sistema de justiça mais sensível e capaz de identificar tais situações e, claro, uma grande mudança cultural.
Ao mesmo tempo, ignorar a necessidade de uma legislação específica diante da vitimização cada vez maior da população LGBT sinaliza uma espécie de tolerância e conivência com a violência praticada contra esse grupo. Deste modo, a reforma proposta pela comissão do Senado vem em boa hora.
É necessário reconhecer que o Brasil ainda é um País profundamente preconceituoso e racista. Criar instrumentos, nesse caso legais, para interferir nessa realidade nada mais é do que o reconhecimento de direitos fundamentais.
*Antropóloga analisa segurança pública, justiça e cidadania
Fonte: Portal iG
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